arete

Category: Termos chaves da Filosofia
Submitter: Murilo Cardoso de Castro

arete

ἀρετή: excelência, virtude

1. O conceito de virtude teve uma longa história evolutiva na cultura grega antes de ser incorporado na problemática da filosofia. Os pré-socráticos, cuja principal preocupação era uma physis corpórea, não estavam muito interessados em especulações sobre a arete; há alguns pensamentos ocasionais sobre o assunto, como em Heráclito designação de prudência como a mais alta virtude (Diels, frg. 12) e em Demócrito a insistência sobre o caráter interior da arete (Diels, frgs. 62, 96, 244, 264), mas não é prestada verdadeira atenção filosófica à arete antes da geração de Sócrates.

2. A própria identificação socrática da virtude e do conhecimento foi um lugar-comum para os seus sucessores (Aristóteles, Eth. Eud. I, 1216b, Ethica Nichomacos VII, 1145b), e os «diálogos socráticos» de Platão dirigem-se no sentido de uma procura das definições das várias virtudes, Laques 190c-199e; e é provavelmente uma hipostasiação destas definições que culmina na teoria platônica das formas (ver eidos). Para Platão há um eidos da arete (Ménon 72c) e das várias espécies de aretai (Parm. 130b); na Republica 442b-d descreve as quatro «virtudes cardeais» desejáveis no estado ideal, uma explanação que tem como correlatos as classes dos homens no estado e as divisões da alma (ver psyche, sophrosyne).

3. Para Aristóteles a virtude é um meio (meson), e ele distingue entre virtudes morais e intelectuais (Ethica Nichomacos II, 1103a-b). A aproximação socrática intelectualista da virtude é ainda visível em Aristóteles, mas temperada também pelo reconhecimento dos elementos volitivos (ver proairesis). Para os estoicos a essência da virtude estava em «viver em harmonia com a natureza» (ver nomos).

Para outros aspectos da moralidade, ver praxis, phronesis, adiaphoron, dike e, para os seus correlatos ontológicos, agathon, kakon. [FEPeters]



A excelência (ἀρετή) enquanto perseverança corajosa (ἀνδρεία [andreia]) é a possibilidade única que existe para autenticamente resolvermos uma situação destrutiva e perversiva (κακία [kakia]) provocada pelo medo terrível (φοβός [phobos], δέος [deos]) que a vida nos pode trazer, em que ela nos pode fazer cair. A excelência (ἀρετή), enquanto justiça justificada (δικαιοσύνη [dikaiosyne]), é a possibilidade única a escolher, quando nos encontramos na situação destruidora e perversa provocada pela presença do desejo de prazer (ηδονής επιθυμία [hedones epithymia]) na nossa existência. O desejo de prazer pelo prazer só é superado na nossa existência quando escolhemos a possibilidade que lhe dá sentido e o permite ultrapassar, não nos deixando sucumbir ao efeito surtido pela sua ação.

Tanto a perseverança corajosa (ἀνδρεία [andreia]) como a justiça justificadora (δικαιοσύνη [dikaiosyne]) ou o olhar a salvo do coração (σωφροσύνη [sophrosyne]) são as completudes (τέλη [tele]) em vista das quais é possível dar o sentido e a direção que nos orientam em situações aparentemente sem sentido, bloqueadas pela crise. Elas correspondem a uma outra forma de olhar que transcende a mera patologia do instante, cuja lógica decide o para sempre da qualidade do instante vivido. A excelência (ἀρετή) corresponde ao olhar para o único objetivo que nos pode dar um projeto de vida que resolve a situação hermética de toda e qualquer afetação patológica.

A presentifiçação das situações patológicas de sofrimento (λύπη [lype]) e de prazer (ἡδονή [hedone]) permite-nos fazer a identificação da estrutura prática, localizando-a numa dimensão irreal. Uma tal presentifiçação permite-nos igualmente perceber que a eclosão da excelência (ἀρετή) se verifica num plano atemático que não está dado à partida. O ponto de vista que põe a descoberto a excelência (ἀρετή) da situação humana (πρᾶξις [praxis]) ultrapassa a potência de toda e qualquer aparição patológica e procura dar compreensão às situações de cada vez criadas. As nossas análises permitem a concretização fenomenal do sentido da excelência (ἀρετή) em Platão como sendo organização estrutural (τάξις [taxis]) e ordenação constitutiva (κόσμος [kosmos]).

Da interpretação e compreensão da excelência (ἀρετή) como organização estrutural (τάξις [taxis]) e ordenação constitutiva (κόσμος [kosmos]) resulta a crítica aristotélica. E que esta interpretação tem como resultado um olhar técnico sobre a realidade prática, isto é, segundo Aristóteles uma redução de todos os horizontes de ser, quaisquer que eles sejam, a um ideal que vê os seus temas na sua diferença. Quer dizer, em última análise esbatem-se os contornos dos [18] horizontes físico e prático com vista à constituição de um acesso aos entes enquanto tais. [CaeiroArete:18-19]

Submitted on:  Sat, 04-Dec-2021, 16:53