Inconsciente

Category: Termos chaves da Filosofia
Submitter: mccastro

Inconsciente

Os românticos descobriram o Inconsciente, justamente porque cultuaram o magnetismo, o sonambulismo, a astrologia, a alquimia e o meta-psiquismo. O Inconsciente, Unbewusstsein, descoberto pelos românticos, veio depois a revolucionar completamente toda a psicologia; Freud encontrou o Inconsciente já descoberto há quase cem anos, quando formulou a sua psico-análise. A teoria do Inconsciente vem de Carus e de G. H. von Schubert, (se não quisermos lembrar as sugestões no mesmo sentido feitas por Leibniz e Hegel), Carus; e von Schubert receberam a influência de Schelling, que se dedicava a estranhas experiências de sonambulismo. A mística, o sortilégio, o inconsciente, o sub-consciente, a magia branca e a magia negra, o hipnotismo, a dupla personalidade (Doppelgang), o poder misterioso dos eflúvios da natureza, a audiência das entidades invisíveis, foram temas que fascinaram os românticos. O romantismo foi herdeiro direto da alquimia medieval e da sua mística. Os antecedentes da sua filosofia estão em Meister Eckhart e Jakob Böhme. Franz von Baader, pelas suas conferencias sobre Böhme, pelo seu convívio com Schelling e pelo seu pensamento próprio é um elo importantíssimo nessa corrente que vem até os neoplatônicos da atualidade. Os românticos cultuaram o Inconsciente como aspecto noturno da personalidade; tiveram o culto da Noite, não só da noite individual e subjetiva, mas também e principalmente da Noite Cósmica, como anterior ao Dia e mesmo revelação dos segredos mais profundos da natureza. G. H. von Schubert escreveu uma obra expressiva até no seu título: Aspectos do lado Noturno das Ciências da Natureza. A obra de Friedrich von Hardenberg, — Novalis — está centrada no culto da Noite e por meio da Noite na compenetração simpática da Natureza. Seus Hinos à Noite e seu estranho fragmento Os Discípulos de Saís, exprimem esse sentimento profundo, Naturgefühl, que faz com que o poeta e a natureza se identifiquem como duas faces do mesmo espírito: A identidade do Espírito e da Natureza, tal é o tema da filosofia idealista, que vê o mundo gerado pela magia do Espírito. Joseph von Görres, místico católico, teve o culto da Noite Cósmica (vide Alfred Beaumler, Der Mythus von Orient und Occident, Beck’sche Verlag, 1956) e dentre suas obras uma das mais importantes foi dedicada à Magia: Die Christliche Mystik: Mystik, Magie und Dämonie.

A descoberta romântica do Inconsciente enriqueceu extraordinariamente todos os campos do conhecimento e da imaginação humana. O Inconsciente é o reino esquecido aonde se recolhem todas as vivências do passado pessoal e popular. Não é um depósito de recalques, como supunha Freud, mas um princípio ativo pelo qual o passado age no presente. — No mesmo ano, (1814), apareceram a Simbólica dos sonhos de G. H. von Schubert (que, com Carus formulou a tese do Inconsciente), e os Contos Populares dos Irmãos Grimm, que fundaram o que depois veio a ser o Volklore. O Inconsciente está associado a todos os contos populares, os contos de heróis e de fadas, tesouros que dormem na alma popular.

Ao inconsciente, como relicário das memórias ancestrais, está ligado o culto nostálgico da idade heroica e da Mutterland perdida. Os Irmãos Grimm lançaram um movimento linguístico e literário que depois acompanhou toda a evolução do romantismo e nutriu o culto das grandes nostalgias e das grandes façanhas. O movimento de ressurreição da Idade Média, iniciado na época do Sturm und Drang, e do qual Goethe participou, teve, na Alemanha, um forte aspecto nacionalista, que assumiu a sua plenitude com os Irmãos Grimm. A Gramática Alemã, a História da Língua Alemã, a Mitologia Alemã foram escritas por Jacob Grimm; a reconstituição das lendas heroicas germânicas, inclusive a Rolandslied, se deve a Wilhelm Grimm. O resultado foi a introdução do método histórico no estudo da gramática e a revitalização de todas as antiguidades e lendas germânicas: Foi como a ressurreição das fontes da língua, que retornou ao presente com todas as lendas e contos populares a que deu forma. Juntos, os Irmãos Grimm começaram um gigantesco Dicionário da Língua Alemã, cuja preocupação era restabelecer os antigos radicais germânicos, expurgando os termos de procedência estrangeira [Esse gigantesco Dicionário, começado pelos Irmãos Grimm, foi terminado em 1961, depois de cem anos de trabalho e colaboração de várias gerações. Compõe-se de 32 volumes, redigidos na linha da inspiração original.]. Este movimento, associado à ideia do inconsciente popular, portador das antigas tradições, teve enorme importância para o nacionalismo cultural.

A imagem da comunidade primordial, os deuses pré-cristãos, o Walhalla, Wotan e Thor, os heróis legendários, a árvore Ygdrasil, o sopro e a tempestade das grandes florestas, tudo o que retomou sua forma na música wagneriana, são tesouros do inconsciente do Volk. Os deuses, ardentemente chamados por Hölderlin, voltaram efetivamente com Wagner. Em Wagner, mais do que em Schubert, Beethoven e Brahms, a música se explicitou como linguagem específica do inconsciente nacional. A música não tem, como a linguagem falada, um conjunto de significados mais ou menos delimitados, conscientes e lógicos; a música irrompe do inconsciente mais profundo, trazendo consigo a nostalgia, a evocação, os transes emocionais inexplicáveis^ a música evoca as matrizes originais. Por isso, mais do que a linguagem falada, a música se apresentou muitas vezes aos românticos como a efusão direta da sua Urquelle. O tesouro encontrado por Siegfried na caverna subterrânea é a imagem da riqueza sepulta no inconsciente; os anões que guardavam o tesouro petrificaram-se, assim como nas torrentes do movimento emocional se petrificam os obstáculos conscientes à revelação das vivências profundas. E cada povo, segundo os românticos, se encontra e se manifesta a si mesmo, quando descobre esse tesouro oculto no seu inconsciente. [Barbuy]

Submitted on:  Sun, 25-Mar-2012, 13:57