
De modo muito particular, será preciso interrogar sobre o papel dos conceitos teóricos nas ciências. Têm uma função real? São verdadeiramente necessários? E se são, como operam? Para além destas questões, deveremos nos esforçar, mais profundamente, por colocar em perspectiva a própria linguagem científica na sua íntegra, ao menos relativamente a um certo ponto de vista, aquele de uma interrogação sobre os signos.
Mas, não é possível propor-se, de pronto, a elaboração de uma teoria geral da linguagem científica. Talvez este projeto seja mesmo absolutamente ilusório. Com efeito, no interior do que chamamos ciência, é preciso distinguir vários grupos bastante diversos de disciplinas. Aliás, para ser totalmente preciso, dever-se-ía distinguir subgrupos no interior destes grupos. Contudo, poderemos aqui nos contentar com uma divisão extremamente geral e bastante esquemática; para o fim que intentamos, eia será suficiente. Distinguiremos três grupos de ciências: as ciências formais, as empírico-formais e as hermenêuticas.
As ciências formais são as matemáticas e a lógica. É possível designá-las no singular, referindo-se simplesmente à ciência dos sistemas formais, sob a condição, porém, que se inclua, na noção de "sistema formal", tanto as teorias matemáticas no sentido tradicional, quanto as teorias lógicas, assim como todas as considerações meta-teóricas que se reportem a estas disciplinas.
As ciências empírico-formais são aquelas construídas segundo o modelo da física. Visam uma realidade empiricamente apreensível, utilizando, porém, na análise desta realidade, recursos fornecidos pelas ciências do primeiro tipo.
Por fim, as ciências hermenêuticas são as ciências da interpretação. Com efeito, podemos definir a hermenêutica como a disciplina que se ocupa da interpretação dos signos em geral e dos símbolos em particular. Todo processo interpretativo busca pôr em evidência uma significação não imediatamente aparente. A significação é uma relação entre um signo e uma entidade pertencente ao mundo real ou ao mundo ideal (indivíduo, classe, propriedade ou relação). (O mundo ideal é aquele das entidades não empiricamente captáveis, tais como os objetos matemáticos ou as realidades puramente lógicas.) De fato, as ciências hermenêuticas visam a realidade humana, enquanto apreensível nos traços por ela deixados na natureza, isto é, nas ações, registráveis e efetivamente registradas, e nas obras. Tanto nas ações do homem quanto em suas obras, atesta-se a presença de significações. Ora, desde que se trata de significações, o método hermenêutico deve intervir.
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No domínio das matemáticas, não faltam exemplos que mostram o papel explicativo dos conceitos. Deste modo, a noção topológica de dimensão permite explicar porque não há mais pontos em um quadrado do que em um de seus lados, ou em um cubo mais que em um quadrado. Trata-se aí de uma situação que aparece na teoria cardinal dos conjuntos. Esta situação é explicada, sendo eliminado o aparente paradoxo, graças ao conceito de dimensão e à teoria correspondente. Outro exemplo é fornecido pela noção de grupo. Esta noção permitiu explicar porque a equação geral do quinto grau não é solucionável por radicais. Estávamos, então, em presença de uma situação algébrica de um determinado nível; ela foi elucidada graças a conceitos algébricos mais potentes. A teoria dos grupos fornece a chave de uma estrutura, da qual o fenômeno a ser explicado constituía uma exemplificação.
Portanto, os conceitos das ciências formais podem desempenhar um papel explicativo. Todavia, examinando-se mais atentamente, percebe-se que é descrevendo que eles explicam. Com efeito, a explicação é feita pela apreensão de uma estrutura mais geral. O conceito é o meio graças ao qual o espírito capta e caracteriza esta estrutura. Em suma, apenas descreve a estrutura que apresenta a chave da situação a ser explicada. Vale dizer, portanto, que o conceito nas ciências formais é, ao mesmo tempo, descritivo e explicativo. [Ladrière]