
(gr. phantasia; lat. imaginatio, phantasia; in. Imagination; fr. Imagination; al. Einbildungskraft; it. Immaginazioné). Em geral, a possibilidade de evocar ou produzir imagens, independentemente da presença do objeto a que se referem. Aristóteles definiu a imaginação nesses termos, sendo o primeiro a analisá-la, em De anima (III, 3). Aristóteles distinguiu a imaginação em primeiro lugar da sensação, em segundo lugar da opinião. imaginação não é sensação porque uma imagem pode existir mesmo quando não há sensação; p. ex., no sono. imaginação não é opinião porque a opinião exige que se acredite naquilo que se opina, enquanto isso não acontece com a imaginação, que, portanto, também pode pertencer aos animais. O caráter que aproxima a imaginação da opinião é que ela, assim como a opinião, também pode ser falaz. Aristóteles considerou a imaginação como uma mudança (kinesis) gerada pela sensação, semelhante a esta, embora não ligada a ela. (De an., III, 428 b 26). Nesse sentido, a imaginação é condição da apetição, que tende para alguma coisa que não está presente e da qual não se tem sensação atual (Ibid., 433 b 29). Esse conceito de imaginação permaneceu inalterado por muito tempo. Como Aristóteles já observara, a imaginação confere à alma possibilidades várias, ativas ou passivas, que são enfatizadas por muitos filósofos. S. Agostinho diz: "As imagens são originadas por coisas corpóreas e por meio das sensações: estas, uma vez recebidas, podem ser facilmente lembradas, distinguidas, multiplicadas, reduzidas, ampliadas, organizadas, invertidas, recompostas do modo que mais agrade ao pensamento" (De vera rei, 10, § 18). Todas essas são possibilidades próprias da imaginação. E Tomás de Aquino, que pouca ou nenhuma importância atribui à imaginação, que, assim como a sensibilidade, se limita a captar a semelhança e não a essência das coisas (5. Th., I, q. 57, a. I), atribui entretanto múltiplas funções ao seu produto, que é a imagem (Ibid., q. 93, a. 9). A definição de imaginação não muda muito nas fases posteriores da história desse termo, mas as funções a ela atribuídas tendem a ser cada vez mais numerosas e complexas. Francis Bacon, em De augmentis scientiarum (1623), o elaborar o plano de uma nova enciclopédia das ciências, colocava a imaginação ao lado da memória e da razão, como uma das faculdades fundamentais, a que serve de base para a poesia. Ainda mais radicalmente, Descartes, em Regulae ad directionen ingenii, reconhecia na imaginação a condição de atividades espirituais diversas: "Essa mesma força, se aplicada com a imaginação ao senso comum, denomina-se ver, tocar, etc; se aplicada à imaginação apenas, coberta de figuras diversas, denomina-se lembrança; se aplicada à imaginação para criar novas figuras, denomina-se imaginação ou representação; se por fim age sozinha, chama-se compreender" (Regulae, XII). Hobbes também via na imaginação uma condição fundamental das atividades mentais. Ele a vinculava estreitamente à sensação: "Na realidade, a imaginação nada mais é que uma sensação enfraquecida ou langorosa por estar distante do seu objeto" (De corp., 25, § 7). E via ná imaginação a inércia do espírito. Assim como um corpo em movimento se moverá eternamente se não surgir obstáculo, nós conservamos a imagem, ainda que mais confusa, de um objeto que não está mais presente ou diante do qual fechamos os olhos. É isso que os latinos chamavam de imaginação e os gregos, de fantasia. Trata-se de uma sensação atenuada, comum aos homens e a outras criaturas, no sono e na vigília" (Leviath., I, 2). Hobbes relaciona com a imaginação a memória, a experiência e, por intermédio destas, também o intelecto e o juízo (Ibid., I, 12). Essa função da imaginação na organização geral das faculdades humanas torna-se dado comum da filosofia dos sécs. XVII e XVIII. Spinoza, que é propenso a atribuir à imaginação todos os erros da mente humana, diz que a mente não erra porque imagina, mas apenas porque acredita na presença das coisas imaginadas, que, por definição, não estão presentes. (Et., II, 17, Scol). Hume, que concorda com Hobbes quanto à função fundamental da imaginação, acredita que o que distingue a imaginação propriamente dita da memória e que portanto está na base da crença, que acompanha a própria memória assim como acompanha a sensibilidade, é unicamente o fato de as ideias da memória serem mais fortes e vivas que as da imaginação (Treatise, I, III, § 5). Obviamente, a função geral atribuída à imaginação em relação às outras atividades do espírito implica que se diferenciem essas funções da outra específica, que leva o nome de imaginação; e isso leva à distinção de vários tipos de imaginação, que foram enumerados no séc. XVIII. Wolff distinguia a imaginação ("faculdade de produzir as percepções das coisas sensíveis ausentes" — Psychol. empírica, § 92) da facultas fingendi, que consiste "em, através da divisão e da composição das imagens, produzir a imagem de uma coisa nunca percebida pelos sentidos" (Ibid., § 138). Análoga a esta foi a distinção estabelecida por Kant, que vê na imaginação "a faculdade das intuições, mesmo sem a presença do objeto", dividindo-a em produtiva, que é "o poder de representação originária do objeto (exhibitio originaria) e precede a experiência", e reprodutiva (exhibitio derivativa), que "traz de volta ao espírito uma intuição empírica anterior". Só as intuições puras de espaço e de tempo são produtos da imaginação produtiva. A imaginação reprodutiva, mesmo quando é denominada poética, nunca é criadora, porque não pode criar uma representação sensível que não tenha sido antes dada à sensibilidade, mas dela extrai seu material (Antr., I, § 28). O conceito de imaginação produtiva — que para Kant é puramente formal, pois só produz as condições da intuição (o espaço-tempo) — fora utilizado mais amplamente na primeira edição da Crítica da Razão Pura, onde se falava de uma "síntese da produção na imaginação", considerada como condição da síntese conceitual da apercepção. A partir de Fichte, o idealismo romântico atribui à imaginação um alcance bem maior que o atribuído por Kant, que a confinara aos limites das condições formais. Para Fichte, a imaginação é a ação recíproca e a luta entre o aspecto finito e o aspecto infinito do Eu, ou seja, o aspecto graças ao qual o Eu impõe um limite à sua atividade produtiva, o aspecto graças ao qual o supera e o distancia. A oscilação desse limite (que é a representação) do produto faz da imaginação algo de flutuante entre realidade e irrealidade. Fichte diz: "A imaginação produz a realidade, mas nela não há realidade; só depois de concebida e compreendida no intelecto, seu produto se torna algo de real" (Wissenschaftslehre, 1794, II. Dedução da representação, III). Essa função criadora da imaginação tornou-se lugar-comum do Romantismo. Sobre ela, Hegel implantou a distinção entre imaginação e fantasia. Ambas são determinações da inteligência, mas a inteligência como imaginação é simplesmente reprodutiva, ao passo que como fantasia é criadora, é "imaginação simbolizante, alegorizante ou poetificante" (Enc., §§ 455-57). Sobre o poder criador da fantasia, Hegel fundou seu conceito de gênio (Vorlesungen über die Ästhetik, ed. Glockner, I, pp. 378 ss.). Tais observações constituíram o ponto de partida para a distinção entre fantasia e imaginação, utilizada sobretudo pela estética romântica e por suas ramificações, até Croce. Afora essa estética, hoje nem a filosofia nem a psicologia estabelecem mais, entre imaginação e fantasia ou entre imaginação reprodutiva e imaginação produtiva, a mesma diferença radical (de qualidade mais que de grau) que a estética romântica supunha. A fenomenologia, em particular, atribuiu uma função especial à imaginação, pois a ela é confiada a representação das vivências como puros objetos de contemplação, o que constitui a própria possibilidade da fenomenologia. Por isso, Husserl diz: "Na fenomenologia, como em todas as ciências eidéticas, as representações, mais precisamente as fantasias livres, têm posição privilegiada em relação às percepções" (Ideen, I, § 70). Isso acontece porque, ao representar-se como "livres fantasias", as experiências humanas revelam sua verdadeira natureza, porquanto se tornam puros objetos de contemplação desinteressada. Deste ponto de vista Husserl afirma paradoxalmente que "a ficção é o elemento vital da fenomenologia" (Ibid., § 70). Mas, sem levar em conta essa função vital que a imaginação reprodutiva desempenha na fenomenologia, as tarefas que ela parece cumprir nas análises filosóficas e psicológicas contemporâneas não são diferentes das que ela parecia cumprir nas análises dos filósofos do séc. XVIII. Por vezes se põe em relevo a função que a imaginação desempenha nas ciências, especialmente na matemática (cf. p. ex., Peirce, Coll. Pap., 4232), mas nem por isso se lhe atribui o poder criativo mágico que a estética romântica via nela. [Abbagnano]