Search
Who is Online
20 user(s) are online (20 user(s) are browsing Léxico Filosofia)

Members: 0
Guests: 20

more...
Novos Termos
Termos Populares
Home Léxico Filosofia  Léxico Filosofia A  A acontecimento acontecimento
Léxico Filosofia

 Browse by letter 
 | 0  | 1  | 2  | 3  | 4  | 5  | 6  | 7  | 8  | 9  |  A  |  B  |  C  |  D  |  E  |  F  |  G  |  H  |  I  |  J  |  K  |  L  |  M  |  N  |  O  |  P  |  Q  |  R  |  S  |  T  |  U  |  V  |  W  |  X  |  Y  |  Z  |

acontecimento

Definition:
Ereignis
Begebenheit
Vorgang
Geschehnis
Vorkommnis

Toda investigação, e não apenas a investigação que se move no âmbito da questão central do ser, é sempre uma possibilidade ôntica da presença [Dasein]. O ser da presença [Dasein] tem o seu sentido na temporalidade. Esta, por sua vez, é também a condição de possibilidade da historicidade enquanto um modo de ser temporal da própria presença [Dasein], mesmo abstraindo da questão do se e como a presença [Dasein] é um ente “no tempo”. A determinação de historicidade se oferece antes daquilo a que se chama de história (ACONTECIMENTO pertencente à história universal). Historicidade indica a constituição de ser do “acontecer”, próprio da presença [Dasein] como tal. É com base na historicidade que a “história universal”, e tudo que pertence historicamente à história do mundo, torna-se possível. Em seu ser fático, a presença [Dasein] é sempre como e “o que” ela já foi. Explicitamente ou não, a presença [Dasein] é sempre o seu passado e não apenas no sentido do passado que sempre arrasta “atrás” de si e, desse modo, possui, como propriedades simplesmente dadas, as experiências passadas que, às vezes, agem e influem sobre a presença [Dasein]. Não. A presença [Dasein] “é” o seu passado no modo de seu ser, o que significa, a grosso modo, que ela sempre “acontece” a partir de seu futuro. Em cada um de seus modos de ser e, por conseguinte, também em sua compreensão de ser, a presença [Dasein] sempre já nasceu e cresceu dentro de uma interpretação de si mesma, herdada da tradição. De certo modo e em certa medida, a presença [Dasein] se compreende a si mesma de imediato a partir da tradição. Essa compreensão lhe abre e regula as possibilidades de seu ser. Seu próprio passado, e isso diz sempre o passado de sua “geração”, não segue, mas precede a presença [Dasein], antecipando-lhe os passos. STMSC: §6
O esclarecimento da origem do “tempo”, “no qual” entes intramundanos vêm ao encontro, do tempo como intratemporalidade, revela uma possibilidade essencial de temporalização da temporalidade. Com isso, prepara-se a compreensão de uma temporalização ainda mais originária da temporalidade. Nela funda-se a compreensão de ser constitutiva do ser da presença [Dasein]. O projeto de um sentido do ser em geral pode cumprir-se {CH: vigência (advento e ACONTECIMENTO)} no horizonte do tempo. STMSC: §45
Para a presença [Dasein], enquanto ser-no-mundo, muitas coisas podem ser impendentes. Em si mesmo, impender não é o que caracteriza propriamente a morte. Ao contrário, também essa interpretação poderia supor que a morte devesse ser compreendida no sentido de um ACONTECIMENTO impendente que vem ao encontro dentro do mundo. Impendente pode ser, por exemplo, uma tempestade, a reforma da casa, a chegada de um amigo, isto é, entes simplesmente dados, à mão ou ainda co-presentes. A morte impendente não possui esse tipo de ser. STMSC: §50
O teor público da convivência cotidiana “conhece” a morte como uma ocorrência que sempre vem ao encontro, ou seja, como “casos de morte”. Esse ou aquele, próximo ou distante, “morre”. Desconhecidos “morrem” todo dia, toda hora. “A morte” vem ao encontro como um ACONTECIMENTO conhecido, que ocorre dentro do mundo. Como tal, ela permanece na não-surpresa característica de tudo aquilo que vem ao encontro na cotidianidade. O impessoal também já assegurou uma interpretação para esse ACONTECIMENTO. A fala pronunciada ou, no mais das vezes, “fugidia” sobre a morte diz o seguinte: algum dia, por fim, também se morre mas, de imediato, não se é atingido pela morte. STMSC: §51
A análise desse “morre-se” impessoal desvela, inequivocamente, o modo do ser-para-a-morte cotidiano. Numa tal fala, ele é compreendido como algo indeterminado, que deve surgir em algum lugar mas que, numa primeira aproximação, para si mesmo, ainda-não é simplesmente dado, não constituindo, portanto, uma ameaça. O “morre-se” divulga a opinião de que a morte atinge, por assim dizer, o impessoal. A interpretação pública da presença [Dasein] diz: “morre-se” porque, com isso, qualquer um outro e o próprio impessoal podem dizer com convicção: mas eu não; pois esse impessoal é o ninguém. A “morte” nivela-se a uma ocorrência que, embora atinja a presença [Dasein], não pertence propriamente a ninguém. Se a ambiguidade é o próprio da falação, isso se dá, sobretudo, nessa fala sobre a morte. A morte que é sempre minha, de forma essencial e insubstituível, converte-se num ACONTECIMENTO público que vem ao encontro do impessoal. A fala assim caracterizada refere-se à morte como um “caso” que permanentemente ocorre. Ele propaga a morte como algo sempre “real”, mas encobre-lhe o caráter de possibilidade e os momentos que lhe pertencem de irremissibilidade e insuperabilidade. com essa ambiguidade, a presença [Dasein] adquire a capacidade de perder-se no impessoal, no tocante a um poder-ser privilegiado, que pertence ao seu ser mais próprio. O impessoal dá razão e incentiva a tentação de encobrir para si o ser-para-a-morte mais próprio. STMSC: §51
Escapar da morte, encobrindo-a, domina, com tamanha teimosia, a cotidianidade que, na convivência, os “mais próximos” frequentemente ainda convencem quem “está à morte” de que ele haverá de escapar da morte e, assim, retornar à cotidianidade tranquila de seu mundo de ocupações. Essa “preocupação” significa inclusive a tentativa de “consolar” quem “está à morte”. Embora pretenda restituir-lhe a presença [Dasein], não faz senão ajudar a velar-lhe ainda mais sua possibilidade de ser, mais própria e irremissível. É desta maneira que o impessoal busca constantemente tranquilizar a respeito da morte. No fundo, essa tranquilidade vale não apenas para quem “está à morte” mas, sobretudo, para aqueles que “consolam”. E, quando deixa de viver, esse ACONTECIMENTO não deve chegar a perturbar e a desestabilizar o que é público em sua ocupação despreocupada. Não é raro perceber a morte dos outros como um desagrado e até mesmo como uma falta de tato social contra que o público deve precaver-se. STMSC: §51
Todavia, ao mesmo tempo que o impessoal tranquiliza a presença [Dasein], desviando-a de sua morte, ele mantém seu direito e prestígio, regulando tacitamente o modo de comportamento frente à morte. No âmbito público, “pensar na morte” já é considerado um medo covarde, uma insegurança da presença [Dasein] e uma fuga sinistra do mundo. O impessoal não permite a coragem de se assumir a angústia com a morte. O predomínio da interpretação pública do impessoal também já decidiu acerca da disposição que deve determinar a atitude frente à morte. Angustiando-se com a morte, a presença [Dasein] coloca-se diante da possibilidade insuperável, a cuja responsabilidade ela está entregue. O impessoal ocupa-se em reverter essa angústia num medo frente a um ACONTECIMENTO que advém. Ademais, considera-se a angústia, que no medo se torna ambígua, uma fraqueza que a presença [Dasein] segura de si mesma deve desconhecer. Segundo esse decreto mudo do impessoal, o que “cabe” é a tranquilidade indiferente frente ao “fato” de que se morre. A elaboração dessa indiferença “superior” aliena a presença [Dasein] de seu poder-ser mais próprio e irremissível. STMSC: §51
A presença [Dasein] cotidiana encobre, na maior parte das vezes, a possibilidade mais própria, irremissível e insuperável de seu ser. Essa tendência fática de encobrimento confirma a seguinte tese: como fática, a presença [Dasein] está na não-verdade. Em consequência, a certeza inerente ao encobrimento do ser-para-a-morte só pode ser um ter-por-verdadeiro inadequado, e não uma espécie de incerteza, no sentido de dúvida. A certeza inadequada mantém encoberto aquilo de que está certa. Se a compreensão “impessoal” da morte é a de um ACONTECIMENTO que vem ao encontro dentro do mundo, então a certeza a ela relacionada não diz respeito ao ser-para-o-fim. STMSC: §52
No momento em que a presença [Dasein] se perde no impessoal, já se decidiu sobre o poder-ser mais próximo e fático da presença [Dasein], ou seja, sobre as tarefas, regras, parâmetros, a premência e a envergadura do ser-no-mundo da ocupação e preocupação. O impessoal já sempre impediu para a presença [Dasein] a apreensão dessas possibilidades ontológicas. O impessoal encobre até mesmo o ter-se dispensado do encargo de escolher explicitamente tais possibilidades. Fica indeterminado quem “propriamente” escolhe. Essa escolha feita por ninguém, através da qual a presença [Dasein] se enreda na impropriedade, só pode refazer-se quando a própria presença [Dasein] passa da perdição do impessoal para si mesma. Essa passagem, no entanto, deve possuir o modo de ser por cuja negligência a presença [Dasein] se perde na impropriedade. A passagem do impessoal, ou seja, a modificação existenciária do impessoalmente si mesmo para o ser-si-mesmo de maneira própria deve-cumprir-se como recuperação de uma escolha. Recuperar a escolha significa escolher essa escolha, decidir-se por um poder-ser a partir de seu próprio si-mesmo. Apenas escolhendo a escolha é que a presença [Dasein] possibilita para si mesma o seu poder-ser próprio {CH: o ACONTECIMENTO do ser-filosofia, liberdade}. STMSC: §54
O ser da presença [Dasein] é a cura. Ela compreende em si facticidade (estar-lançado), existência (projeto) e decadência. Sendo, a presença [Dasein] é lançada, mas não foi levada por si mesma para o seu pre [das Da]. Ela é em se determinando como poder-ser que pertence a si mesma, mas não no sentido de ter dado a si mesma o que tem de próprio. Existindo, ela nunca retorna aquém de seu estar-lançado, de tal modo que sempre só pudesse desenvolver esse “que é e (comporta) um ter de ser” propriamente a partir de seu ser si mesma e conduzi-lo ao seu pre [das Da]. O estar-lançado não se encontra aquém dela como um ACONTECIMENTO que de fato ocorreu e que se teria desprendido da presença [Dasein] e com ela acontecido. Mas enquanto é, e como cura, a presença [Dasein] é constantemente o seu “que é”. Existindo, a presença [Dasein] é o fundamento de seu poder-ser porque só pode existir como o ente que está entregue à responsabilidade de ser o ente que ela é. Embora não tendo ela mesma colocado o fundamento, a presença [Dasein] repousa em sua gravidade que, no humor, se revela como peso. STMSC: §58
Comecemos a discussão com o último ponto. Em todas as interpretações da consciência, a “má” consciência possui primazia. A consciência é primordialmente “má”. Com isso se diz que toda a experiência da consciência faz, em primeiro lugar, a experiência de “culpa”. Mas como se anuncia e se dá a compreender o ser-mau na ideia de consciência? A “vivência da consciência” surge após o ato realizado ou omitido. A voz segue o sucedido e remete ao ACONTECIMENTO pelo qual a presença [Dasein] se carregou de culpa. Mas quando a consciência anuncia um “ser-culpado”, isto não se faz como fazer apelo para..., mas como referência que recorda a culpa acometida. STMSC: §59
Mas não será que também pertence à presença [Dasein] existente o fato de, passando o seu tempo, levar cotidianamente em conta o “tempo” e regular a sua “contagem” numa astronomia e num calendário? A orientação só se tornará suficientemente abrangente para que se possa problematizar o sentido ontológico da cotidianidade como tal, no momento em que a interpretação da temporalidade da presença [Dasein] incluir o “ACONTECIMENTO” cotidiano da presença [Dasein] e a ocupação de contar com o “tempo”, inerente a esse acontecer. Mas, no fundo, o termo cotidianidade nada mais pretende indicar do que a temporalidade que possibilita o ser da presença [Dasein]. É, portanto, somente no âmbito da discussão de princípio do sentido do ser em geral e de suas possíveis derivações que se poderá conceituar, de forma suficiente, a cotidianidade. STMSC: §71
De há muito que o “tempo” funciona como critério ontológico, ou melhor, ôntico, para uma distinção ingênua das diversas regiões dos entes. Distingue-se um ente “temporal” (os processos naturais e os ACONTECIMENTOS da história) de um ente “não temporal” (as relações numéricas e espaciais). Costuma-se opor o sentido “atemporal” das proposições ao curso “temporal” de sua articulação e expressão. Descobre-se ainda um “abismo” entre o ente “temporal” e o eterno “supratemporal” e se busca, sempre de novo, estender uma ponte entre ambos. “Temporal” diz aqui o que está sendo a cada vez “no tempo”, uma determinação que sem dúvida é ainda bastante obscura. Persiste o fato de, na acepção de ser e estar no tempo, o tempo servir como critério para distinguir as regiões de ser. E, não obstante, até hoje não se questionou ou investigou como o tempo chegou a desempenhar essa função ontológica fundamental e com que direito funciona como um critério dessa espécie e, por fim e sobretudo, como se exprime uma possível importância ontológica verdadeira do tempo nessa utilização ontologicamente ingênua. Dentro do horizonte da compreensão “vulgar”, o “tempo” acabou tendo, por assim dizer, “por si mesmo”, essa função ontológica “evidente” e nela se manteve até hoje. STMSC: §5
Uma variedade de graus intermediários ocorre entre a interpretação ainda totalmente resguardada no compreender ocupacional e o caso extremo de um enunciado teórico sobre seres simplesmente dados. Enunciados sobre ACONTECIMENTOS no mundo circundante, descrições de manualidades, “relatos de situação”, apreensão e fixação de uma “ocorrência”, descrição de uma conjuntura, narração de ocorrências, estas “proposições” não podem ser reduzidas a enunciações teóricas sem que ocorra uma deturpação essencial de seu sentido. Assim como estas, elas têm “origem” na interpretação da circunvisão. STMSC: §33
Como devemos, então, determinar o que se fala nessa fala? Que apelo a consciência faz para o interpelado? Em sentido rigoroso, nada. O apelo não exprime nada, não fornece nenhuma informação sobre ACONTECIMENTOS do mundo, nada tem para contar. Muito menos pretende iniciar, no próprio interpelado, uma “conversa consigo mesmo”. “Nada” é con-fessado para o si-mesmo interpelado, mas este é apelado para si mesmo, ou seja, para assumir seu poder-ser mais próprio. Correspondendo à sua tendência, o apelo não coloca o si-mesmo interpelado numa “negociação” consigo mesmo mas, enquanto um fazer apelo para o seu poder-ser mais próprio, o apelo é uma “a”-pelação (para “adiante”) da presença [Dasein] para suas possibilidades mais próprias. STMSC: §56
Há significados de “história” que não possuem o sentido de ciência histórica nem a visam como objeto. Eles se referem ao próprio ente que nem sempre é, necessariamente, objetivado. Dentre estes sentidos reivindicam um uso privilegiado aqueles em que este ente é compreendido como passado. Este significado explicita-se na seguinte fala: isto ou aquilo já pertence à história. “Passado” significa aqui não ser mais simplesmente dado ou então ainda ser simplesmente dado, embora sem “efeito” sobre o “presente”. De todo modo, entendido como o passado, o histórico também possui o significado contrário, quando dizemos: não se pode escapar a da história. História significa, nesse caso, o passado {CH: que outrora antecedeu, mas agora ficou para trás} mas que ainda surte efeito. Como quer que seja, o histórico, na acepção de passado, é compreendido numa relação positiva ou privativa de efeito sobre o “presente”, no sentido do “aqui e agora” real. “Passado” tem ainda uma curiosa duplicidade de sentido. O passado pertence, indiscutivelmente, ao tempo anterior, aos ACONTECIMENTOS de então. Mas pode, não obstante, ainda ser simplesmente dado “hoje”, como por exemplo as ruínas de um templo grego. com ele, um “pedaço do passado” ainda está “presente”. STMSC: §73
História não significa apenas o “passado” no sentido do que passou, mas também a sua proveniência. O que “tem história” encontra-se inserido num devir. O seu “desenvolvimento” pode ser ora ascensão, ora queda. O que, desse modo, “tem uma história” pode, ao mesmo tempo, “fazer” história. “Fazendo época”, determina-se numa “atualização”, o “futuro”. História significa, aqui, um “conjunto de ACONTECIMENTOS e influências” que atravessa “passado”, “presente” e “futuro”. Aqui, o passado não tem primazia. STMSC: §73
Referindo-se ao homem como “sujeito” dos ACONTECIMENTOS, os quatro significados estão conectados. Como se há de determinar este caráter de acontecer? Será o acontecer uma sequência de processos, uma alternância de aparecimento e desaparecimento de dados? De que maneira esse acontecer da história pertence à presença [Dasein]? Será que a presença [Dasein] de fato é primeiro “algo simplesmente dado” para depois, oportunamente, entrar “numa história”? Será que a presença [Dasein] só se torna histórica, enredando-se em circunstâncias e dados? Ou será que o ser da presença [Dasein] se constitui, primeiramente, pelo acontecer, de tal modo que somente porque a presença [Dasein] é, em seu ser, histórica é que circunstâncias, dados e envios se tornam ontologicamente possíveis? Por que, na caracterização “temporal” da presença [Dasein], que acontece “no tempo”, justamente o passado é que possui uma função acentuada? STMSC: §73
Reflexões complicadas, poder-se-ia dizer. Ninguém nega que, no fundo, a presença [Dasein] humana seja o “sujeito” primário da história. Isto é explicitado de forma suficientemente clara pelo conceito vulgar de história. Todavia, a tese: “a presença [Dasein] é histórica” não significa apenas o fato ôntico de que o homem representa um “átomo” mais ou menos importante no fluxo da história do mundo, sendo a bola deste jogo de circunstâncias e ACONTECIMENTOS. A tese coloca o seguinte problema: Em que medida e em quais condições ontológicas, a historicidade, enquanto constituição essencial, pertence à subjetividade do sujeito “histórico”? STMSC: §73
De fato, a história não é o contexto dos movimentos de alteração do objeto nem a sequência de vivências soltas do “sujeito”. Será que o acontecer da história diz respeito ao “encadeamento” de sujeito e objeto? Se o acontecer já remete à relação sujeito-objeto então ainda é preciso questionar o modo de ser deste encadeamento como tal, caso este encadeamento seja o que, no fundo, “acontece”. A tese da historicidade da presença [Dasein] não afirma que é histórico o sujeito sem mundo mas sim o ente que existe como ser-no-mundo. O acontecer da história é o acontecer de ser-no-mundo. Em sua essência, historicidade da presença [Dasein] é historicidade de mundo que, baseada na temporalidade ekstática e horizontal, pertence à sua temporalização. Como a presença [Dasein] existe faticamente, também vem ao encontro o que se descobriu dentro do mundo. Com a existência do ser-no-mundo histórico, tanto o manual quanto o ser simplesmente dado sempre já estão inseridos na história do mundo. Instrumento e obra, os livros, por exemplo, têm seu “destino”, construções e instituições têm sua história. Mas também a natureza é histórica. Sem dúvida ela não o é quando falamos de “história da natureza” e sim como paisagem, região de exploração e ocupação, como campo de batalha e lugar de culto. Como tal, este ente intramundano é histórico e sua história não significa algo “exterior” que simplesmente acompanha a história “interior” da “alma”. Chamamos este ente de pertencente à história do mundo. Deve-se, no entanto, atentar para o duplo significado da expressão “história do mundo”, aqui entendida ontologicamente. Significa, por um lado, o acontecer do mundo, em sua unidade existente e essencial com a presença [Dasein]. Mas, na medida em que, junto com o mundo faticamente existente, entes intramundanos são sempre descobertos, também significa o “acontecer” intramundano do manual e do ser simplesmente dado. Com efeito, o mundo só é histórico enquanto mundo dos entes intramundanos. O que “acontece” com o instrumento e a obra como tais possui um caráter próprio de movimentação que permanece, até agora, inteiramente obscuro. Um anel, por exemplo, ao ser “presenteado” e “usado” não sofre, nesse ser, apenas mudanças de lugar. A movimentação do acontecer em que algo “acontece com ele” não se deixa apreender a partir do movimento, entendido como mudança de lugar. Isso vale para todos os “processos” e ACONTECIMENTOS pertencentes à história do mundo e, de certo modo, também para as “catástrofes naturais”. Mesmo desconsiderando que ultrapassaria os limites do tema, não podemos aprofundar aqui o problema da estrutura ontológica do acontecer próprio da história do mundo. Pois o propósito dessa exposição é conduzir ao enigma ontológico da movimentação do acontecer em geral. STMSC: §75


Semelhante disposição de humor em que a gente se sente desta ou daquela maneira situa-nos - perpassados por esta disposição de humor - em meio ao ente em sua totalidade. O sentimento de situação da disposição de humor não revela apenas, sempre à sua maneira, o ente em sua totalidade. Mas este revelar é simultaneamente - longe de ser um simples episódio - um ACONTECIMENTO fundamental de nosso ser-aí. MHeidegger: QUE É METAFÍSICA?

A angústia do audaz não tolera nenhuma contraposição à alegria ou mesmo à agradável diversão do tranquila abandonar-se à deriva. Ela situa-se - aquém de tais posições - na secreta aliança da serenidade e doçura do anelo criador. A angústia originária pode despertar a qualquer momento no ser-aí. Para isto ela não necessita ser despertada por um ACONTECIMENTO inusitado. À profundidade de seu imperar corresponde paradoxalmente a insignificância do elemento que pode provocá-la. Ela está continuamente à espreita e, contudo, apenas raramente salta sobre nós para arrastar-nos à situação em que nos sentimos suspensos. MHeidegger: QUE É METAFÍSICA?

O ser-aí humano somente pode entrar em relação com o ente se se [62] suspende dentro do nada. O ultrapassar o ente acontece na essência do ser-aí. Este ultrapassar, porém, é a própria metafísica. Nisto reside o fato de que a metafísica pertence à "natureza do homem". Ela não é uma disciplina da filosofia "acadêmica", nem um campo de ideias arbitrariamente excogitadas. A metafísica é o ACONTECIMENTO essencial no âmbito de ser-aí. Ela é o próprio ser-aí. Pelo fato de a verdade da metafísica residir neste fundamento abissal possui ela, como vizinhança mais próxima, sempre à espreita, a possibilidade do erro mais profundo. É por isso que nenhum rigor de qualquer ciência alcança a seriedade da metafísica. A filosofia jamais pode ser medida pelo padrão da ideia da ciência. MHeidegger: QUE É METAFÍSICA?

A "angústia" em face da angústia, pelo contrário, pode enganar-se de tal modo que desconheça as simples referências na esfera essencial da angústia. Que seria toda coragem se não tivesse, na experiência da angústia fundamental, seu constante elemento de confronto? Na medida em que diminuímos a angústia fundamental e a referência do ser ao homem, nela iluminada, aviltamos a essência da coragem. Mas esta é capaz de suportar o nada. A coragem reconhece, no abismo do espanto, o espaço do ser apenas entrevisto, a partir de cuja iluminação cada ente primeiramente retorna àquilo que é e é capaz de ser. A preleção nem se compraz numa "filosofia da angústia" nem procura insinuar a impressão de uma "filosofia heroica". Ela pensa apenas aquilo que apareceu ao pensamento ocidental, desde o começo, como aquilo que deve ser pensado e permaneceu, entretanto, esquecido: o ser. Mas o ser não é produto do pensamento. Pelo contrário, o pensamento essencial é um ACONTECIMENTO provocado pelo ser. MHeidegger: QUE É METAFÍSICA?

O pensamento originário é o eco do favor do ser pelo qual se ilumina e pode ser apropriado o único ACONTECIMENTO: que o ente é. Este eco é a resposta humana à palavra da voz silenciosa do ser. A resposta do pensamento é a origem da palavra humana; palavra que primeiramente faz surgir a linguagem como manifestação da palavra nas palavras. MHeidegger: QUE É METAFÍSICA?

Se, de tempos em tempos, não houvesse um pensamento oculto no fundamento essencial do homem historial, então ele jamais seria capaz do reconhecimento, suposto que, em toda reflexão e em todo agradecimento, deve existir um pensamento que pensa originariamente a verdade do ser. Mas de que outro modo encontraria, um dia, uma humanidade o caminho para o reconhecimento originário que não pelo fato de o favor do ser oferecer ao homem, pela aberta referência a si mesma, a nobreza do despojamento, no qual a liberdade do sacrifício esconde o tesouro de sua essência? O sacrifício é a despedida do ente em marcha para a defesa do favor do ser. O sacrifício pode, sem dúvida, ser preparado e servido pelo agir e produzir na esfera do ente, mas jamais pode ser por ele realizado. Sua realização emana da in-sistência a partir da qual todo homem historial age - também o pensamento essencial é um agir - protegendo o ser-aí instaurado para a defesa da dignidade do ser. Esta in-sistência é a impassibilidade que não permite que seja contestada a oculta disposição para a despedida própria de cada sacrifício. O sacrifício tem sua terra natal na essência daquele ACONTECIMENTO que é o ser chamando o homem [71] para a verdade do ser. É por isso que o sacrifício não admite cálculo algum pelo qual seria calculada sua utilidade, sejam os fins visados mesquinhos ou elevados. Tal cálculo desfigura a essência do sacrifício. A mania dos fins confunde a limpeza do respeito humilde (preparado para a angústia) da coragem para o sacrifício, que presume morar na vizinhança do indestrutível. MHeidegger: QUE É METAFÍSICA?

O pensamento, dócil à voz do ser, procura encontrar-lhe a palavra através da qual a verdade do ser chegue à linguagem. Apenas quando a linguagem do homem historial emana da palavra, está ela inserida no destino que lhe foi traçado. Atingido, porém, este equilíbrio em seu destino, então lhe acena a garantia da voz silenciosa de ocultas fontes. O pensamento do ser protege a palavra e cumpre nesta solicitude seu destino. Este é o cuidado pelo uso da linguagem. O dizer do pensamento vem do silêncio longamente guardado e da cuidadosa clarificação do âmbito nele aberto. De igual origem é o nomear do poeta. Mas, pelo fato de o igual somente ser igual enquanto é distinto, e o poetar e o pensar terem a mais pura igualdade no cuidado da palavra, estão ambos, ao mesmo tempo, maximamente separados em sua essência. O pensador diz o ser. O poeta nomeia o sagrado. Não podemos analisar aqui, sem dúvida, como, pensado a partir do ACONTECIMENTO (Wesen) do ser, o poetar e o reconhecer e o pensar estão referidos um ao outro e ao mesmo tempo separados. Provavelmente o reconhecer e o poetar se originam, ainda que de maneira diversa, do pensamento originário que utilizam, sem, contudo, poderem ser, para si mesmos, um pensamento. MHeidegger: QUE É METAFÍSICA?


Entretanto, a metafísica expressa o ser constantemente e das mais diversas formas. Ela mesma suscita e fortalece a aparência de que a questão do ser foi por ela levantada e respondida. Mas a metafísica não responde, em nenhum lugar, à questão da verdade do ser, porque nem a suscita como questão. Ela não problematiza por que é que somente pensa o ser enquanto representa o ente enquanto ente. Ela visa ao ente em sua totalidade e fala do ser. Ela nomeia o ser e tem em mira o ente enquanto ente. Os enunciados da metafísica se desenvolvem de maneira estranha, desde o começo até sua plenitude, numa geral troca do ente pelo ser. Esta troca, sem dúvida, deve ser pensada como ACONTECIMENTO e não como engano. Ela, de maneira alguma, tem suas razões numa simples negligência do pensamento ou numa exatidão no dizer. Em consequência desta geral troca, a representação atinge o auge da confusão quando se afirma que a metafísica realmente põe a questão do ser. MHeidegger: O RETORNO AO FUNDAMENTO DA METAFÍSICA

Mas, pelo fato de a questão da existência sempre estar apenas a serviço da única questão do pensamento, a saber, a serviço da pergunta (a ser desenvolvida) pela verdade do ser, como o fundamento escondido de toda a metafísica, o tratado Ser e Tempo, que tenta o retorno ao fundamento da metafísica, não traz como título Existência e Tempo, também não Consciência e Tempo, mas Ser e Tempo. Este título, porém, também não pode ser pensado como se correspondesse a estes outros títulos de uso corrente: Ser e vir-a-ser, ser e aparecer, ser e pensar, ser e dever. Pois em tudo o ser é ainda aqui representado de maneira limitada, como se "vir-a-ser", "aparecer", "pensar", "dever", não pertencessem ao ser; pois, evidentemente não são nada e por isso devem pertencer ao ser. Em Ser e Tempo "ser" não é outra coisa que "tempo", na medida em que "tempo" é designado como pré-nome para a verdade do ser, pré-nome cuja verdade é o ACONTECIMENTO (Wesende) do ser e assim o próprio ser. Entretanto, por que "tempo" e "ser"? MHeidegger: O RETORNO AO FUNDAMENTO DA METAFÍSICA


Instalar-se na vida corrente é, entretanto, em si mesmo o não deixar imperar a dissimulação do que está velado. Sem dúvida, também na vida corrente existem enigmas, obscuridades, questões não decididas e coisas duvidosas. Mas todas estas questões, que não surgem de nenhuma inquietude e estão seguras de si mesmas, são apenas transições e situações intermediárias nos movimentos da vida corrente e, portanto, inessenciais. Lá onde o velamento do ente em sua totalidade é tolerado sob a forma de um limite que acidentalmente se anuncia, a dissimulação como ACONTECIMENTO fundamental caiu no esquecimento. MHeidegger: SOBRE A ESSÊNCIA DA VERDADE


O comum-pertencer de homem e ser ao modo da recíproca provocação nos faz ver, de uma proximidade desconcertante, o fato e a maneira como o homem está entregue como propriedade ao ser e como o ser é apropriado ao homem. Trata-se de simplesmente experimentar este ser próprio de, no qual homem e ser estão reciprocamente a-propriados, experimentar que quer dizer penetrar naquilo que digamos acontecimento-apropriação [NT: O filósofo procura delimitar aquele âmbito em que homem e ser acontecem e se apropriam reciprocamente (no caso da relação homem-técnica, chamado arrazoamento) pela palavra Ereignis. Traduzo-a por acontecimento-apropriação, como os franceses por evénément-appropriation. Na palavra alemã se escondem ambos os pólos expressos pelo termo composto, usado pelas duas línguas românticas em questão. Em seu livro Unterwegs zur Sprache Heidegger comenta seu uso da palavra Ereignis: "Hoje, quando aquilo que ainda quase não foi pensado ou pensado pela metade é logo entregue apressadamente a toda forma de publicidade, parecerá a muitos inacreditável o fato de o autor ter utilizado já, em seus manuscritos, há mais de vinte e cinco anos, a palavra acontecimento-apropriação para a coisa que aqui pensa. Esta coisa, ainda que simples em si mesma, permanece, em primeiro lugar, difícil de ser pensada porque o pensamento deve desacostumar-se a cair no engano de que aqui se pensa ‘o ser’ como acontecimento-apropriação. O acontecimento-apropriação é essencialmente outra coisa, porque muito mais rico que qualquer possível determinação metafísica do ser. Pelo contrário, o ser pode ser pensado, no que respeita a sua origem essencial, a partir do acontecimento-apropriação" (p. 260).] A palavra acontecimento-apropriação é tomada da linguagem natural. "Er-eignen" (acontecer) significa originariamente: "er-äugnen", quer dizer, descobrir com o olhar, despertar com o olhar, apropriar. A palavra acontecimento-apropriação deve, agora, pensada a partir da coisa apontada, falar como palavra-guia a serviço do pensamento. Como palavra-guia assim pensada, ela se deixa traduzir tão pouco quanto a palavra-guia grega logos ou a chinesa Tao. A palavra acontecimento-apropriação não significa mais aqui aquilo que em geral chamamos qualquer ACONTECIMENTO, uma ocorrência. A palavra é empregada agora como singulare tantum. Aquilo que designa só se dá no singular, no número da unidade, ou nem mesmo num número, mas unicamente. O que no arrazoamento, como constelação de ser e homem, experimentamos através do moderno universo da técnica, é um prelúdio daquilo que se chama acontecimento-apropriação. Este, contudo, não permanece necessariamente em seu prelúdio. Pois no acontecimento-apropriação fala a possibilidade de ele poder superar e realizar em profundidade o simples imperar do arrazoamento num acontecer mais originário. Uma tal superação e aprofundamento do arrazoamento, partindo do acontecimento-apropriação e nele penetrando, traria a redenção historial - portanto, jamais unicamente factível pelo homem - do universo técnico, de sua ditadura, para pô-lo a serviço no âmbito através do qual o homem encontra mais.autenticamente o caminho para o acontecimento-apropriação. MHeidegger: IDENTIDADE E DIFERENÇA

Pensar o ACONTECIMENTO (-apropriação) como acontecimento-apropriação significa trabalhar na edificação deste âmbito dinâmico. O material de construção para esta construção dinâmica o pensamento o recebe da linguagem. Pois ela é o movimento mais delicado, mas também mais frágil, que tudo retém na construção suspensa do acontecimento-apropriação. Na medida em que nossa essência está entregue à linguagem como propriedade, residimos no acontecimento-apropriação. MHeidegger: IDENTIDADE E DIFERENÇA


O que acabamos de dizer permite, obriga até, de certo modo, a dizer como o Ereignis não deve ser pensado. Não podemos representar o que vem designado com o nome de Ereignis, guiados pela semântica ordinária; pois esta compreende Ereignis no sentido de ACONTECIMENTO e fato - e não a partir do apropriar como o alcançar e destinar iluminados e protetor. MHeidegger: TEMPO E SER

Assim, ouviu-se, por exemplo, proclamar recentemente que a pretendida unificação da Comunidade Econômica Europeia é um ACONTECIMENTO europeu de significação histórica universal. Se, porém, a palavra Ereignis é usada no contexto de uma análise do ser, se se ouve esta palavra apenas em sua significação ordinária, então, literalmente se impõe falar do Ereignis do ser. Pois sem o ser ente algum como tal é capaz de ser. Desta forma, pode o ser ser apresentado como o mais alto e mais significativo ACONTECIMENTO. MHeidegger: TEMPO E SER


A superação da metafísica é pensada na dimensão da história do ser. Ela prenuncia a sustentação (Verwindung) originária do esquecimento do ser. Mais antigo embora também mais escondido do que o prenúncio é o que nele se anuncia. Trata-se do ACONTECIMENTO do próprio (Ereignis). O que, no modo de pensar da metafísica, aparece como prenúncio de uma outra coisa, chega e toca como o brilho derradeiro de uma clareira mais originária. A superação permanece digna de ser pensada somente enquanto se pensa a sustentação. Esse pensamento insistente ainda pensa a superação. Tal pensamento faz a experiência do ACONTECIMENTO (Ereignis) singular da des-apropriação dos entes, em que se iluminam a indigência da verdade do ser e a originariedade da verdade, e também transluz com desprendimento o vigor essencial do humano. A superação é a trans-missão da metafísica em sua verdade. [GA7]


A partir de um simples toque do pensar essencial, o ACONTECIMENTO da verdade do seer precisa ser transposto do primeiro para o outro início, para que, em consonância, ressoe a canção totalmente diversa do seer. E é por isto que a história está aqui realmente por toda parte: a história que se recusa ao historiológico, porque não deixa emergir o passado, mas se mostra em tudo o arrojar-se para além no que está por vir. [tr. Casanova; GA65: 2]

Se o outro início ainda estiver se preparando, então isso se acha velado como uma grande mudança, e tanto mais velado, quanto maior for o ACONTECIMENTO. O erro existe naturalmente, como se uma transformação essencial, que a tudo fundamentalmente captura, também fosse imediatamente sabida e concebida em geral por todos e transcorresse na esfera pública. Só poucos se encontram sempre na claridade desse raio. A maioria tem aquela “felicidade” de se encontrar em meio a algo presente à vista e, assim, empreender o que lhe é próprio na medida em que persegue a utilidade para um todo. [tr. Casanova; GA65: 8]

Será que está determinada para nós futuramente uma história totalmente diversa daquilo que parece ser hoje considerado como história: a turva caçada às ocorrências que devoram a si mesmas e que só se deixam fixar ainda por meio do mais estridente barulho? Se é que uma história, ou seja, um estilo do ser-aí, ainda nos deve ser doado, então isto só pode ser a história velada da grande tranquilidade, na qual e como a qual o domínio do último deus abre e configura o ente. Portanto, a grande tranquilidade precisa primeiramente se abater sobre o mundo para a terra. Essa tranquilidade emerge apenas do silêncio. E esse silenciamento só desponta da retenção. Ela atravessa de maneira afinadora enquanto tonalidade afetiva fundamental a intimidade da contenda entre mundo e terra e, com isto, a contestação do ataque da apropriação em meio ao ACONTECIMENTO. O ser-aí como contestação dessa contenda tem sua essência no abrigo da verdade do seer, isto é, do último deus em meio ao ente. [tr. Casanova; GA65: 13]

Enquanto insistência do ser-aí, cuidado é a decisão antecipadora da verdade do ser e o aprisionamento que suporta, sobretudo, algo referido no aí; o fundamento desse “sobretudo” é a retenção do ser-aí. Essa retenção afina apenas enquanto pertencimento à verdade do ser, que se apropriou em meio ao ACONTECIMENTO. [tr. Casanova; GA65: 13]

A ipseidade do homem – do homem histórico tanto quanto do povo – é um âmbito de ACONTECIMENTO, no qual ele só se mostra a-propriado, se ele mesmo alcança o tempo-espaço aberto, no qual pode acontecer uma apropriação. [tr. Casanova; GA65: 19]

O pensamento inicial, porém, encontra o mais duro obstáculo na autocompreensão inexpressa, que o homem hoje tem de si. Abstraindo-nos completamente das interpretações particulares e dos estabelecimentos particulares de finalidades, o homem se considera hoje como um exemplar “presente à vista” do gênero “ser humano”. Isto se deixa transpor para o ser histórico como um ACONTECIMENTO no interior de uma copertinência gerada. Onde essa interpretação do ser do homem (e, com isso, também de um ser do povo) impera, falta todo e qualquer ponto de apoio e toda e qualquer pretensão a uma chegada do deus. Não tem lugar aí nem mesmo a pretensão da experiência da fuga dos deuses. Precisamente essa experiência pressupõe que o ser humano histórico se saiba exposto em meio ao ente, que é abandonado pela verdade de seu ser. [tr. Casanova; GA65: 24]

O pensar inicial é a performance originária de ressonância, conexão de jogo, salto e fundação em sua unidade. Performance quer dizer aqui que essa unidade – ressonância, conexão de jogo, salto e fundação em sua unidade – só pode ser a cada vez assumida e suportada humanamente, que elas mesmas são sempre essencialmente um outro e pertencem ao ACONTECIMENTO do ser-aí. [tr. Casanova; GA65: 27]

Isto condiciona um procedimento que, em certos limites, sempre vai de encontro, em um primeiro momento, ao visar habitual e que precisa seguir durante um certo trecho com ele, a fim de, então, exigir no instante correto a transformação do pensar, ainda que sob o poder da mesma palavra. Por exemplo, “decisão” pode e deve ser visada de início, por mais que não moralmente, de acordo com o movimento de levá-la a cabo, como ato do homem, até que, repentinamente, ela vise à essência do próprio seer, o que não significa agora que o seer seria interpretado “antropologicamente”, mas o contrário: que o homem é recolocado na essência do seer e é arrancado das correntes da “antropologia”. Do mesmo modo: “maquinação” – uma espécie de comportamento do homem e, repentina e propriamente, o inverso: a essência (in-essência) do seer, na qual se enraiza pela primeira vez o fundamento da possibilidade dos “funcionamentos”. Esse “o contrário”, contudo, não é simplesmente um truque “formal” da conversão significativa em meras palavras, mas a transformação do próprio homem. Com certeza, o conceber correto dessa transformação e, antes de tudo, de seu espaço de ACONTECIMENTO, isto é, o fundar do mesmo, está o mais intimamente possível entrelaçado com o saber da verdade do seer. [tr. Casanova; GA65: 41]

Ser usado pelos deuses, por meio de tal elevação ser esmagado, na direção desse velado precisamos inquirir a essência do seer enquanto tal. Nós não podemos, então, porém, explicar o seer como o aparentemente ulterior, mas precisamos concebê-lo como a origem, que de-cide e se apropria em meio ao ACONTECIMENTO pela primeira vez dos deuses e do homem. Essa inquirição do seer leva a termo a abertura do campo de jogo temporal de sua essenciação: a fundação do ser-aí. [tr. Casanova; GA65: 43]

O abandono do ser: ele precisa ser experimentado como o ACONTECIMENTO fundamental de nossa história e ser trazido ao saber – ao saber configurador e condutor. Para tanto, por sua vez, é necessário: 1) Que o abandono do ser seja lembrado em sua história longa e encoberta, na história que se encobre a si mesma. Não é suficiente o aceno para o atual; 2) Que o abandono do ser seja experimentado do mesmo modo como a indigência, que prepondera na transição para cá e que atiça essa transição como o a-cesso ao porvir. Mesmo a transição precisa ser experimentada em toda a sua amplitude e em todo o seu caráter multifacetado. [tr. Casanova; GA65: 52]

Abandono do ser. O que Nietzsche reconheceu pela primeira vez e, com efeito, na orientação pelo platonismo como niilismo é, em verdade, visto a partir da questão fundamental que lhe é estranha, apenas o primeiro plano do ACONTECIMENTO muito mais profundo do esquecimento do ser, que vem cada vez mais à tona precisamente na perseguição a encontrar a resposta para a questão diretriz. Mas mesmo o esquecimento do ser (sempre de acordo com a sua determinação) não é o envio destinamental mais originário do primeiro início, mas o abandono do ser, que talvez tenha sido o mais encoberto e o mais negado por meio do Cristianismo e de seus sucessores secularizados. Quanto ao fato de o ente enquanto tal ainda poder aparecer e de, contudo, a verdade do seer o ter abandonado, cf a despotencialização da physis e do ón como idea. Em que direção o ente enquanto tal é usado e abusado em tal aparição abandonada pelo ser (objeto e “em si”)? Atenta para a obviedade e nivelamento e para a própria incognoscibilidade do seer na compreensão de ser dominante. [tr. Casanova; GA65: 55]

Abandono do seer é, no fundo, uma de-generescência do seer. A essência é perturbada e só ganha a verdade como correção da re-presentação – noeindianoeinidea. O ente permanece o que se presenta, e propriamente ente é o constantemente presente e, assim, o que a tudo con-diciona, o in-condicionado, o ab-soluto, ens entium, Deus etc. Todavia, que ACONTECIMENTO de que história é esse abandono? Há uma história do seer? E o quão raramente e quase nunca ela vem encoberta à luz? [tr. Casanova; GA65: 55]

A longa hesitação da verdade e das decisões é uma recusa da via mais curta e dos maiores instantes. Nessa era, “o ente”, aquilo que se denomina o “efetivamente real”, “a vida” e “os valores”, é desapropriado do seer em meio ao ACONTECIMENTO. [tr. Casanova; GA65: 57]

3) A irrupção do massificado. Com isto, não se tem em vista apenas as “massas” em um sentido “social”; essas massas só ascendem porque o número já vigora e o calculável, isto é, o acessível a qualquer um da mesma maneira. O que é comum a muitos e a todos é, para os “muitos”, aquilo que eles conhecem como o pre-ponderante; por isso, a interpelação com vistas ao cálculo e à rapidez, assim como, inversamente, a adução realizada por esses do massificado em trilhos e quadros. Aqui a mais aguda oposição, porque a mais discreta, em relação ao raro, ao único (a essência do ser). Por toda parte nesses encobrimentos do abandono do ser, a inessência do ente se difunde, o não ente se expande e, em verdade, com a aparência de um “grande” ACONTECIMENTO. A propagação desses encobrimentos do abandono do ser e, com isso, precisamente deles mesmos é o mais forte obstáculo, porque ao mesmo tempo um obstáculo que não tem de modo algum como ser notado, para a correta apreciação e fundação da tonalidade afetiva fundamental da retenção, na qual pela primeira vez a essência da verdade reluz, na medida em que a remoção para o interior do ser-aí acontece. Aqueles modos da estada no ente e de seu “domínio” são, porém, a tal ponto degradantes porque eles não gastam somente um dia, por exemplo, com formas aparentemente apenas externas que abarcam um interior. Eles colocam a si mesmos no lugar do interior e negam finalmente a diferença entre um interior e um exterior, uma vez que eles são o que há de primeiro e uma vez que eles são tudo o que há. A isso corresponde o modo como se alcança o saber, e a distribuição calculada, rápida e maciça de conhecimentos não compreendidos na maior quantidade possível e no menor tempo possível; “a escolaridade”, uma palavra, que coloca de ponta cabeça em seu significado atual precisamente a essência da escola e da schole. Mas mesmo isso é apenas um novo sinal da reviravolta, que não detém o desenraizamento crescente porque ela não chega às raízes do ente e não quer mesmo chegar até aí; porque se ela chegasse a essas raízes, ela precisaria se deparar com a sua própria ausência de solo. Ao cálculo, à rapidez e à massificação alia-se ainda um outro elemento que, ligado aos três de uma maneira acentuada, assume o encobrimento e a dissimulação da decomposição interior – esse elemento é: [O desnudamento, a publicização e a vulgarização da tonalidade afetiva] [tr. Casanova; GA65: 58]

4) O desnudamento, a publicização e a vulgarização da tonalidade afetiva. A essa desertificação criada por meio daí corresponde a inautenticidade crescente de toda e qualquer postura e, juntamente com isso, a despotencialização da palavra. A palavra só continua se mostrando como o invólucro e como a excitação tonitruante, junto à qual não se pode mais ter em vista um “sentido”, porque se retira todo o poder de reunião de uma meditação possível e se despreza a meditação em geral como algo estranho e impotente. Tudo isso se torna tanto mais sinistro, quanto menos impertinentemente ele se desenrola, quanto mais obviamente ele se apossa do cotidiano e é coberto por assim dizer por novas formas da instituição. A consequência do desnudamento da tonalidade afetiva, que é ao mesmo tempo a dissimulação do vazio crescente, se mostra completamente na incapacidade de experimentar precisamente o ACONTECIMENTO propriamente dito, o abandono do ser, como indigência afinadora, supondo mesmo que ele poderia ser mostrado em certos limites. [tr. Casanova; GA65: 58]

O que significa esse primado da mobilização? O fato de se impor aí necessariamente uma nova batalha do homem é apenas a consequência oposta a esse ACONTECIMENTO, mas nunca a “meta”. Mas há ainda “metas”? Como emerge o estabelecimento de uma meta? A partir do início. E o que é início? [tr. Casanova; GA65: 74]

Se a “metafísica” se torna visível como o ACONTECIMENTO que pertence ao ser-aí enquanto tal, então isso não deve ser considerado como uma ancoragem “antropológica” muito módica da disciplina da metafísica no homem, mas, juntamente com o ser-aí, conquista-se aquela base, na qual a verdade do seer se funda, de tal modo que, agora, o seer mesmo passou a se mostrar como originariamente dominante e um posicionamento da excedência do ente, o que significa, porém, do sair do ente e, em verdade, como ente presente à vista e como objeto, se tornou impossível. Assim, vem à tona pela primeira vez o que era a metafísica, justamente essa excedência do ente em direção à entidade (ideia). Inevitavelmente ambíguo, contudo, permanece essa determinação da “metafísica”, na medida em que as coisas se mostram de tal modo, como se a metafísica fosse apenas uma outra concepção atual do conceito até aqui, uma concepção que não tocaria em nada na coisa mesma. Ela só é uma tal concepção, porém, na medida em que a concepção da essência da “metafísica” se torna de antemão inteiramente uma fundação do ser-aí, vedando à “metafísica” todo e qualquer caminho para uma outra possibilidade. Conceber de maneira transitoriamente pensante significa: transpor o concebido para o interior de sua impossibilidade. Será que ainda é necessário proteger expressamente essa defesa da “metafísica” diante da mistura com a tendência “antimetafísica” do “positivismo” (e de suas variantes)? Muito pouco de fato, logo que levamos em conta o fato de que o “positivismo” apresenta, sim, o mais tosco de todos os modos “metafísicos” de pensamento, na medida em que ele contém por um lado uma decisão completamente determinada sobre a entidade do ente (sensibilidade) e, por outro lado, ultrapassa de maneira constante justamente esse ente por meio do estabelecimento principial de uma “causalidade” do mesmo tipo. Para o pensar transitório, porém, não se trata de uma “hostilidade” em relação à “metafísica”, hostilidade essa por meio da qual ela seria colocada de novo precisamente em posição, mas de uma superação da metafísica a partir de seu fundamento. A metafísica chegou ao fim. Não porque ela questionou demais, de maneira não crítica demais, de modo extravagante demais a entidade do ente, mas porque, de acordo com a queda do primeiro início, o seer no fundo buscado nunca teve como ser questionado com essa questão e, por fim, decaiu, em meio ao impasse dessa impotência, na “renovação” da “ontologia”. [tr. Casanova; GA65: 85]

O ACONTECIMENTO da questão acerca do ente enquanto tal, o ACONTECIMENTO do questionamento da entidade é em si uma determinada abertura do ente enquanto tal, de tal modo que o homem experimenta aí a sua determinação essencial, que emerge dessa abertura (homo animal rationale). Mas o que é que essa abertura do ente abre sobre a entidade e, com isso, sobre o seer? Carece-se de uma história, isto é, de um início e de suas ascendências e progressos, a fim de deixar que se experimente (para os que perguntam e são iniciantes) o fato de que pertence à essência do seer a recusa. Esse saber é, porque ele desce e pensa o niilismo ainda mais originariamente em meio ao abandono do ser, a superação propriamente dita do niilismo, e a história do primeiro início é arrancada, assim, completamente da aparência de em vão e de mera errância; agora pela primeira vez a grande iluminação se abate sobre toda a obra pensante até aqui. [tr. Casanova; GA65: 87]

Se buscarmos a história da filosofia efetivamente no ACONTECIMENTO do pensar e de seu primeiro início e se mantivermos aberto esse pensar em sua historicidade por meio do desdobramento da questão diretriz não desdobrada através de toda essa história até Nietzsche, então o movimento interno desse pensar, apesar de só ser retido por meio de fórmulas, por meio de passos e níveis particulares, pode ser retido: A experiência e a apreensão e reunião do ente em sua verdade solidificam-se na questão acerca da entidade do ente a partir do fio condutor e da antecipação do “pensar” (enunciar apreendedor). [tr. Casanova; GA65: 91]

Somente a posição distante em relação ao primeiro início torna possível experimentar o fato de que aí e, em verdade, necessariamente, a questão acerca da verdade (aletheia) permaneceu inquestionada e de que esse não ACONTECIMENTO determinou de antemão o pensar ocidental em relação à “metafísica”. E só esse saber joga ao nosso encontro a necessidade de preparar o outro início e de experimentar no desdobramento dessa prontidão a indigência mais própria em sua plena claridade, o abandono do ser que, profundamente velado, é a contraparte daquele não ACONTECIMENTO e que, por isto mesmo, não pode ser de maneira alguma explicado a partir de inconvenientes e de cochilos de hoje e ontem. [tr. Casanova; GA65: 91]

Que, para a meditação marcada pela dinâmica da retomada, o tempo enquanto verdade do ser brilhe de saída para nós a partir do primeiro início não significa dizer que a plena verdade originária do seer só possa ser fundada no tempo. Em verdade, é preciso tentar antes de qualquer coisa pensar a essência do tempo de maneira tão originária (em sua “extática”), que ela seja concebível enquanto verdade possível para o seer enquanto tal. Mas já esse pensar integralmente o tempo acaba por colocá-lo em uma ligação com o aí do ser-aí, com a espacialidade do ser-aí e, com isso, com o espaço na ligação essencial. Mas tempo e espaço são aqui, medidos pela representação habitual deles, de maneira mais originária e completamente o tempo-espaço, que não se mostra como nenhuma cópula, mas como o mais originário dessa copertinência. Isso, porém, aponta para a essência da verdade como velamento clareante. A verdade do seer não é nada menos do que a essência da verdade, concebida e fundada enquanto velamento clareante, o ACONTECIMENTO do ser-aí, do ponto de virada na viragem enquanto o meio que se abre. [tr. Casanova; GA65: 95]

1) O primeiro início e seu fim abarcam toda a história da questão diretriz de Anaximandro até Nietzsche. 2) A questão diretriz não é questionada inicialmente na apreensão expressa da questão, mas captada por isso mesmo de maneira tanto mais originária e respondida de modo normativo; a irrupção do ente, a pre-sentação do ente enquanto tal em sua verdade; essa fundada no logos (reunião) e no noein (a-preensão). 3) O caminho daqui até a primeira versão, desde então diretriz, da questão em Aristóteles; a preparação essencial por meio de Platão; a confrontação aristotélica com o primeiro início, que ganha ao mesmo tempo por meio daí o cerne de uma interpretação fixamente estabelecida para o que vem depois. 4) A repercussão do modo de formulação da questão que agora retrocede uma vez mais, mas que, porém, a tudo ainda domina no resultado e nos caminhos (doutrina das categorias; teo-logia); a reestruturação do todo por meio da teologia cristã; sob essa figura, o primeiro início permanece, então, apenas histórico, até mesmo ainda em Nietzsche, apesar de sua descoberta dos pensadores iniciais como homens de um nível hierárquico elevado. 5) De Descartes até Hegel uma transformação renovada, mas não uma mudança essencial; a retomada na consciência e a certeza absoluta; em Hegel, realiza-se pela primeira vez uma tentativa filosófica de uma história da questão acerca do ente a partir da posição fundamental conquistada do saber absoluto. 6) O que reside entre Hegel e Nietzsche possui muitas figuras, em parte alguma originariamente no metafísico, nem mesmo em Kierkegaard. Diferentemente da questão diretriz, a questão fundamental desponta enquanto questão concebida com a própria formulação da questão, a fim de saltar a partir dela de volta para o interior da experiência fundamental originária do pensamento da verdade do seer. Mas a questão fundamental também tem enquanto questão concebida um caráter completamente diverso. Ela não é o prosseguimento da formulação da questão que tinha sido empreendida na questão diretriz por Aristóteles. Pois ela emerge por um salto imediatamente de uma necessidade da indigência do abandono do ser, daquele ACONTECIMENTO, que é essencialmente co-condicionado pela história da questão diretriz e por seu desconhecimento. [tr. Casanova; GA65: 119]

O salto é a realização do projeto da verdade do seer no sentido da inserção no aberto, de tal modo que aquele que joga o projeto se experimenta como jogado, isto é, como apropriado pelo ACONTECIMENTO por meio do seer. A abertura por meio do projeto é apenas tal abertura, se ela acontecer como experiência do caráter de jogado e, com isso, do pertencimento ao seer. Essa é a diferença essencial em face de todos os tipos de conhecimento apenas transcendentais no que concerne às condições de possibilidade. [tr. Casanova; GA65: 122]

A guarda do homem, contudo, é o fundamento de uma outra história. Pois ela não se realiza como mero manter-em-vista algo presente. Essa guarda é antes uma guarda fundante. Ela precisa erigir a verdade do seer e abrigá-la no “ente” mesmo, que, assim, desdobra pela primeira vez novamente – inserindo no seer e em seu estranhamento – a simplicidade encantadora de sua essência, ultrapassa toda maquinação e se subtrai à vivência em meio ao erigir de um outro domínio, isto é, de seu âmbito, do qual o último deus se apropriou em meio ao ACONTECIMENTO. É somente por meio da queda e da reviravolta do ente que o ente bifurcado em maquinação e vivência e já calcificado no que não é chega a ceder diante do seer e, com isso, alcança a sua verdade. [tr. Casanova; GA65: 123]

O seer é o estremecimento dessa deização, o estremecimento como extensão do campo de jogo temporal, no qual ele mesmo apropria para si a sua clareira (o aí) em meio ao ACONTECIMENTO como a recusa. [tr. Casanova; GA65: 127]

A medida excessiva não é nenhuma mera demasia quantitativa, mas o subtrair-se a toda avaliação e mensuração. Nesse subtrair-se (encobrir-se), porém, o seer tem a sua proximidade mais imediata na clareira do aí, na medida em que ele se apropria do ser-aí em meio ao ACONTECIMENTO. [tr. Casanova; GA65: 131]

O discurso sobre a ligação do ser-aí com o seer torna o seer ambíguo, ele o torna o em-face-de, o que ele não é, na medida em que ele mesmo se apropria primeiro sempre a cada vez em meio ao ACONTECIMENTO daquilo para o que ele deve se essenciar como um em face de. Por isto, essa ligação também é completamente incomparável com a ligação-sujeito-objeto. [tr. Casanova; GA65: 135]

A unicidade da morte no ser-aí do homem pertence à determinação originária do ser-aí, a saber, ser apropriado em meio ao ACONTECIMENTO pelo seer mesmo, a fim de fundar sua verdade (abertura do encobrir-se). Na inabitualidade e na unicidade da morte abre-se o que há de mais inabitual em todo ente, o próprio seer, que se essencia como estranhamento. Mas para poder pressentir algo desse contexto maximamente originário em geral a partir do posto habitual e gasto do opinar e do calcular comuns, é preciso que se torne visível previamente com toda a agudeza e unicidade a ligação do ser-aí com a morte mesma, a conexão entre caráter resoluto (abertura) e morte, a ante-cipação. Mas essa ante-cipação da morte, de qualquer modo, não para que o mero “nada” seja alcançado, mas, inversamente, para que a abertura para o seer se abra completamente a partir do que há de mais extremo. Todavia, está completamente em ordem que, se não se pensa aqui de maneira “ontológico-fundamental”, tendo por intuito a fundação da verdade do seer, as mais terríveis e disparatadas interpretações equivocadas se imiscuem e se propagam e, naturalmente, uma “filosofia da morte” é justificada. [tr. Casanova; GA65: 161]

A “essência” não é mais o koinon e o genos da ousia e do tode ti (ekaston), mas essenciação como o ACONTECIMENTO da verdade do seer e, em verdade, em sua história plena, que abarca respectivamente o abrigo da verdade no ente. Como, porém, a verdade precisa estar fundada no ser-aí, a essenciação do seer só pode ser conquistada na constância, que o aí suporta no saber assim determinado. A essência como essenciação não é nunca apenas re-presentável, mas só é concebida no saber da tempo-espacialidade da verdade e de seu respectivo abrigo. O saber da essência exige e é ele mesmo o salto para o interior do ser-aí. Por isto, ele nunca pode ser conquistado por meio da mera consideração geral do dado e de sua interpretação já firmada. A essenciação não reside “acima” do ente e cindida dele, mas o ente se encontra no seer e tem apenas nele, se encontrando imerso nele e apartado, a sua verdade como o verdadeiro. Juntamente com esse conceito da essenciação, então, também precisa ser estabelecida e concebida a “diferenciação” de seer e ente e tudo aquilo que está fundado nessa diferenciação, na medida em que cai do “lado” da entidade todo “categorial” e “ontológico”. [tr. Casanova; GA65: 165]

A essenciação e a essência concebidas como ACONTECIMENTO da verdade do seer. O seer não se deixa retransportar para a essenciação, uma vez que essa essenciação mesma se tornou um ente. A questão acerca do ser da essência só é possível e necessária no interior do estabelecimento da essência como koinon (cf mais tarde a questão dos universais). Como quer que a questão venha a ser respondida, a “essência” mesma é sempre degradada. [tr. Casanova; GA65: 166]

A suportabilidade insistente da clareira do encobrir-se é assumida na determinação de uma busca, de um cuidado e de uma guarda do homem, que se apropria do ser em meio ao ACONTECIMENTO, que se sabe pertinente ao ser como a essenciação do seer. [tr. Casanova; GA65: 173]

Ser-aí – o que ao mesmo tempo sub-funda e ultrapassa o homem. Por isto, o discurso acerca do ser-aí no homem como ACONTECIMENTO daquela fundação. No entanto, também se poderia dizer: o homem no ser-aí. O ser-aí “do” homem. [tr. Casanova; GA65: 176]

O que se tem em vista é sempre apenas o projeto da verdade do seer. O próprio jogador, o ser-aí, é jogado, apropriado em meio ao ACONTECIMENTO pelo seer. [tr. Casanova; GA65: 182]

A “imaginação” como ACONTECIMENTO da clareira mesma. Só que a “imaginação”, imaginatio, é o nome que denomina a partir da posição de visada da apreensão imediata do ón e do ente. Computado a partir daí, todo seer e sua reabertura são um construto que se adiciona àquilo que é supostamente palpável. Mas tudo aqui é invertido: “imaginado” no sentido habitual é sempre o assim chamado ente presente à vista “efetivamente real”. É ele que é trazido para o interior de uma construção imagética, que é levado a aparecer na clareira, no aí. [tr. Casanova; GA65: 192]

A ipseidade é mais originária do que todo eu e do que todo tu e nós. Esses só se reúnem enquanto tais no si mesmo e se tornam, assim, a cada vez eles “mesmos”. Inversamente, a dispersão do eu, do tu e do nós, assim como o seu esboroamento e o seu superdimensionamento, não é nenhum mero fracasso do homem, mas o ACONTECIMENTO da impotência em relação a suportar e saber sobre a propriedade, o abandono do ser. [tr. Casanova; GA65: 197]

II. A abertura é: 1) Originariamente o uno-múltiplo, não apenas aquele entre para o que é apreensível e para o apreender (zugon); não são apenas muitas coisas diversas que precisam ser questionadas, mas é como esse elemento uno que precisa ser inquirida a abertura. 2) Não apenas o apreender e o conhecer, mas também todo e qualquer tipo de comportamento e de postura, sobretudo aquilo que denominamos tonalidade afetiva: tudo isso pertence à abertura, que não é um estado, mas um ACONTECIMENTO. 3) O aberto como reaberto e como se abrindo, a abrangência, a re-solução. [tr. Casanova; GA65: 209]

A negação de toda história emerge como comutação de todo ACONTECIMENTO em meio ao factível e instituível, o que só se revela completamente, quando ele se faz valer completamente sem ligação e de maneira apenas confessional em um lugar qualquer e como uma “providência” e um “destino”. [tr. Casanova; GA65: 212]

O quão pouco, porém, a representação diretriz da luz podia fixar aquele aberto e sua abertura e elevá-los ao nível do saber, é algo que se mostra no fato de precisamente a “clareira” e o “clareado” não terem sido apreendidos, mas de a representação ter se desdobrado na direção do luzir, do fogo e da centelha, com o que, então, logo só permaneceu normativa ainda uma relação causal da iluminação, até que, por fim, tudo resvalou e decaiu na indeterminação da “consciência” e da perceptio. Assim como o aberto e a abertura não foram perseguidos em sua essenciação (algo diverso tinha sido antes de tudo em geral entregue aos gregos como tarefa), também não ficou claro nem foi atribuído a uma experiência fundamental a essenciação do velamento – o encobrimento. Aqui também, de maneira autenticamente grega, o velado se transformou em algo ausente, e o ACONTECIMENTO do encobrimento se perdeu tanto quanto, com isso, a necessidade de fundá-lo expressamente e de concebê-lo completamente em sua conexão interna com a essenciação da abertura, fundando, por fim e em primeiro lugar, esse elemento uno também como uma essência originariamente própria. [tr. Casanova; GA65: 214]

A conexão do tempo-espaço com espaço e tempo e o desdobramento desses dois a partir daquele podem ser elucidados em parte o mais prontamente possível de antemão, se tentarmos extrair o espaço e o tempo mesmos da interpretação até aqui, apreendendo-os, porém, na direção dessa interpretação em sua forma pré-matemática. Decisiva, contudo, permanece a questão: como se chega àquilo que permite a matematização em espaço e tempo? A resposta reside na meditação sobre aquele ACONTECIMENTO, segundo o qual o a-bismo, quase sem sondagem, já é soterrado pelo não fundamento (cf o primeiro início). [tr. Casanova; GA65: 242]

[Verdade e abrigo] De onde o abrigo tem a sua indigência e a sua necessidade? A partir do encobrir-se. Para não afastar esse autoencobrimento, mas para inversamente preservá-lo, é preciso o abrigo desse ACONTECIMENTO. O acontecer é transformado e preservado (porquê) na contenda de mundo e terra. A contestação da contenda põe em obra a verdade, põe no utensílio a verdade, ex-perimentando-a como coisa e levando-a a termo em ato e em sacrifício. [tr. Casanova; GA65: 244]

[Os que estão por vir] Eles se encontram no saber dominante como no saber verdadeiro. Quem chega a esse saber não se deixa calcular nem impor. Esse saber é, além disso, inútil e não tem nenhum “valor”; ele não vale e não pode ser imediatamente assumido como condição da empresa que está precisamente em curso. Com o que precisa se iniciar o saber dos que verdadeiramente sabem? Com o conhecimento histórico propriamente dito; isto é, com o saber do âmbito e com a permanência (questionadora) no interior do âmbito, a partir do qual a história por vir se decide. Esse conhecimento histórico nunca consiste na constatação e na descrição dos estados atuais e do armazenamento das ocorrências e de suas metas e pretensões nutridas. Esse saber sabe as horas do ACONTECIMENTO, que forma pela primeira vez história. [tr. Casanova; GA65: 250]

Se esse clamor do aceno extremo, a apropriação mais velada em meio ao ACONTECIMENTO, ainda acontecerá abertamente ou se a indigência a tudo emudecerá e todo domínio permanecerá de fora; e se, caso o clamor aconteça, ele será então ainda apreendido; se o salto para o interior do ser-aí e, com isso, a partir de sua verdade, a viragem ainda vão se tornar história: é aí que se decide o futuro dos homens. O homem pode ainda por séculos espoliar e desertificar o planeta com as suas maquinações, o gigantesco desse impulso pode se “desenvolver” em direção ao irrepresentável e assumir a forma de um rigor aparente, o disciplinamento pelo elemento desértico enquanto tal; a grandeza do seer pode permanecer vedada porque nenhuma decisão mais é tomada sobre a verdade, a não verdade e sua essência. Somente ainda cálculo do sucesso e do insucesso das maquinações é que são computados. Esse cálculo estende-se para uma “eternidade” arrogada, que não é nenhuma eternidade, mas apenas o e-assim-por-diante sem fim do que há de mais fugidio e desértico. [tr. Casanova; GA65: 255]

A determinação histórica da filosofia tem seu ápice no conhecimento da necessidade de criar a escuta para a palavra de Hölderlin. O poder ouvir corresponde a um poder dizer, que fala a partir da questionabilidade do seer. Pois isso é o mínimo que pode ser realizado para a preparação do espaço da palavra. (Se é que tudo não foi invertido ainda e transformado no elemento “científico” e “historiológico-literário”, seria preciso dizer: uma preparação do pensamento para a interpretação de Hölderlin precisa ser criada. “Interpretação” com certeza não tem em vista aqui tornar “compreensível”, mas sim fundar o projeto da verdade de sua poesia na meditação e na tonalidade afetiva, nas quais o ser-aí por vir vibra) (cf Reflexões VI e VII Hölderlin). Essa caracterização histórica da essência da filosofia a concebe como pensar do seer. Esse pensar nunca pode fugir para o interior de uma figura do ente e experimentar nela toda a luz do simples a partir da riqueza reunida de sua obscuridade estruturada em suas junções. Esse pensar também não tem como seguir jamais a dissolução em meio ao amorfo. Esse pensar precisa capturar em um ponto aquém da distinção entre figura e ausência de figura (o que só se dá no ente), no abismo do fundamento da figura, o ímpeto de jogada de seu caráter de jogado e suportá-lo no aberto do projeto. O pensar do seer precisa pertencer ao que tem de ser pensado mesmo de uma maneira completamente diversa de todo e qualquer ajuste em relação ao elemento objetivo porque o seer não tolera a própria verdade como suplemento e como algo trazido para junto de si, mas “é” ele mesmo a essência da verdade. A verdade, aquela clareira do encobrir-se, em cujo aberto os deuses e o homem são apropriados em meio ao ACONTECIMENTO para a sua contra-posição, abre ela mesma o seer como história. Nós talvez precisemos pensar essa história, se é que devemos aprontar o espaço que em seu tempo precisa resguardar em ressonância a palavra de Hölderlin, que denomina uma vez mais os deuses e o homem; e isso para que essa ressonância afine aqueles tonalidades afetivas fundamentais, que determinam o homem por vir em meio à guarda da indigencialidade dos deuses. Essa caracterização da filosofia em termos da história do seer carece de uma explicitação, que auxilie o surgimento de uma lembrança do pensar até aqui (a metafísica), mas retransporte ao mesmo tempo o porvir para o interior da copertinência histórica. [tr. Casanova; GA65: 258]

A diferenciação toma a essência da metafísica conjuntamente com vistas ao ACONTECIMENTO decidido nela, mas nunca decidido nem tampouco decidível por ela, suporta a história velada da metafísica (não a historiologia das opiniões doutrinárias metafísicas), passando para a história do seer, e volta essa história para o espaço efetivo do primeiro início do pensar ocidental do ser, que porta o nome de “filosofia”, cujo conceito se transforma sempre de acordo com o modo e com o caminho do questionamento acerca do ser. [tr. Casanova; GA65: 258]

A história do pensar metafísico e do pensar da história do ser acontece apropriadoramente sobretudo em suas diversas eras segundo potências diversas do primado do ser diante do ente, do ente diante do ser, da confusão dos dois, da extinção de cada primado na era da compreensibilidade calculável de tudo. Nós sabemos o futuro da história do ser, nós sabemos que, se ela quiser permanecer história, o seer mesmo precisará se apropriar do pensar em meio ao ACONTECIMENTO. Mas ninguém conhece a figura do ente vindouro. Só uma coisa é certa: que todo e qualquer re-pensar do seer e toda criação a partir da verdade do seer, sem a assistência já protetora do ente, jamais pôde produzir outras forças de questionamento e de dizer, de jogo e de sustentação, diversas das que foram produzidas pela história da metafísica. Pois esses outros precisam inserir ainda em nome do que lhes é mais próprio o diálogo questionador com o primeiro início, que emergiu em uma clara profundidade, e sua história no pensar. Equipando-se com esse diálogo, eles precisam se tornar, juntamente com os mais solitários do primeiro pensar, os ainda mais solitários do abismo, que não apenas suporta no outro início todos os fundamentos, mas também os sopra. Para aqueles que simplesmente vierem depois, o que se mantém objeto de uma erudição e de uma pesquisa historiológicas e que, por fim, se mostra ainda meramente como instrução escolar, a história do pensar metafísico em suas “obras”, precisa se tornar primeiro história, na qual cada coisa é reunida em sua unicidade e irradia como uma visão luminosa do pensar uma verdade do seer em seu espaço não mensurado próprio. Como uma grandeza do ser-aí pensante é requisitada aí pelo próprio seer, cuja figura nós quase não pressentimos a partir da existência poética de Hölderlin e a partir da viandança horrível de Nietzsche; como no espaço do pensar da história do ser só há ainda essa grandeza, razão pela qual mesmo o discurso sobre a grandeza permanece pequeno demais, a preparação de tal pensar precisa reunir toda inexorabilidade e se movimentar nas mais claras distinções. Pois somente tais distinções garantem a coragem para a insistência no âmbito do impulso do que há de mais questionável, que é usado pelos deuses e esquecido pelo homem, e que nós denominamos o seer. [tr. Casanova; GA65: 259]

Junto ao gigantesco torna-se reconhecível o fato de que todo e qualquer tipo de “grandeza” emerge na história da interpretação “metafísica” inexpressa do ACONTECIMENTO (ideais, atos, criações, sacrifícios) e, por isso, não possui uma essência propriamente histórica, mas antes historiológica. A história velada do seer não conhece o elemento calculador em termos de “grande” e “pequeno”, mas “apenas” o elemento conforme com o seer do decidido, não decidido e desprovido de decisão. [tr. Casanova; GA65: 260]

A posição de transição precisa ter de maneira igualmente clara na meditação: o elemento tradicional do projeto do seer e o outro: o seer como projeto, por mais que a essência projetiva não possa mais se determinar da mesma maneira a partir do elemento representacional, mas precise se determinar a partir do caráter de apropriação em meio ao ACONTECIMENTO do seer. [tr. Casanova; GA65: 262]

Somente esse pensar do seer é verdadeiramente in-condicionado, isto é, somente ele não é condicionado e determinado por algo condicionado fora de si e pelo que precisa ser pensado por ele, mas unicamente determinado por aquilo que precisa ser pensado nele, por meio do seer mesmo, que, contudo, não é “o absoluto”. Na medida em que o pensar (no sentido do re-pensar), porém, conserva a essência a partir do seer; na medida em que até mesmo o ser-aí, cujo re-pensar precisa ser uma insistência, só é apropriado em meio ao ACONTECIMENTO pelo ser, o pensar, isto é, a filosofia, tem sua origem mais própria e mais elevada a partir dela mesma, a partir daquilo que precisa ser pensado nela. Somente agora é que ela se mostra de maneira pura e simplesmente inatacável frente a avaliações e valorações, que calculam tudo de acordo com metas e utilidades, isto é, que abusam correspondentemente tanto da filosofia quanto da arte como uma realização cultural ou mesmo por fim apenas ainda como expressão cultural, colocando-as sob o domínio das suposições, que, ao que parece, dominam a filosofia, mas que, com efeito, permanecem muito abaixo dela, desfigurando a sua essência em meio ao compreensível e impelindo em tal desfiguração para o interior daquilo que ainda é precisamente tolerado e ridicularizado. [tr. Casanova; GA65: 265]

O re-pensar do seer não inventa para si um conceito, mas conquista aquela libertação do apenas ente, que torna a-propriado para a determinação do pensar a partir do seer. O re-pensar expõe na direção daquela história, cujos “acontecimentos apropriadores” não são outra coisa senão os choques do ACONTECIMENTO da própria apropriação. Só podemos dizer isso, por sua vez, na medida em que dizemos: que isso acontece apropriadoramente: e o que significa esse “isso”? O fato de Hölderlin ter criado poeticamente o poeta por vir; o fato de ele mesmo “ser” como o primeiro, que coloca em decisão a proximidade e a distância dos deuses sidos e dos deuses por vir (cf o lugar em termos da história do seer). [tr. Casanova; GA65: 265]

O caráter completamente inabitual do seer em face de todo ente precisa ser “experimentado” pelo homem, ele precisa ser apropriado por ele em meio ao ACONTECIMENTO e levado à verdade do seer. [tr. Casanova; GA65: 269]

O seer des-loca, na medida em que se apropria do ser-aí em meio ao ACONTECIMENTO. Esse des-locamento é uma afinação, sim, o rasgo originário do próprio elemento afinador. A tonalidade afetiva fundamental da angústia suporta a exposição ao des-locamento, na medida em que esse des-locamento anula em um sentido originário, de-põe o ente enquanto tal, isto é, na medida em que esse niilizar não é nenhuma negação, mas, se é que ele pode ser interpretado a partir do comportamento que assume uma posição, uma afirmação do ente enquanto tal como o de-posto. A questão é que a niilização é justamente a própria de-posição, por meio da qual o seer se sobreapropria enquanto de-posição da clareira do aí apropriado em meio ao ACONTECIMENTO. E, por sua vez, a niilização do seer na re-tração, inteiramente irradiada pelo nada, essencia o seer. E somente quando tivermos nos libertado da falsa interpretação do nada a partir do ente, somente quando determinarmos a “metafísica” a partir da niilização do nada e por meio daí, ao invés de, ao contrário, degradarmos o “nada” a partir da metafísica e a partir do primado nela vigente do ente, transformando-o no mero não da determinação e mediação do ente como Hegel e todos metafísicos antes dele: somente então teremos pressentido que força da insistência no ser humano entretece a partir do “deslocamento”, agora visado como tonalidade afetiva fundamental da “ex-periência” do seer. Por meio da metafísica, e isso significa ao mesmo tempo por meio do cristianismo, somos desencaminhados e nos habituamos a supor no “deslocamento”, ao qual pertence a angústia como o nada ao seer, apenas o elemento desértico e sombrio, ao invés de experimentarmos nela a determinação em meio à verdade do seer e a partir dela saber jurisdicionalmente o estado de sua essenciação. [tr. Casanova; GA65: 269]

O entre é a implosão simples, que se apropria do seer em meio ao ACONTECIMENTO naquele ente até então reservado para a sua própria essência que ainda não pode ser denominado assim. Essa implosão é a clareira para o velado. A implosão, contudo, não dispersa, e a clareira não é nenhum mero vazio. [tr. Casanova; GA65: 270]

A excedência dos deuses é o ocaso na fundação da verdade do seer. O seer, porém, se apropria do ser-aí em meio ao ACONTECIMENTO para a fundação de sua verdade, isto é, de sua clareira, porque, sem essa de-cisão clareadora de si mesmo na urgência do deus e na guarda do ser-aí, ele precisaria consumir a si mesmo no fogo da própria brasa não dissolvida. Como podemos saber o quão frequentemente isso já não aconteceu? Se nós o soubéssemos, então não haveria a necessidade de pensar o seer na unicidade de sua essência. [tr. Casanova; GA65: 271]

O saber, porém, por meio do qual a ausência de arte já é historicamente, sem ser conhecida manifestamente e sem ser admitida no interior de uma “atividade artística” constantemente crescente, pertence ele mesmo na essência ao ACONTECIMENTO originário de uma apropriação, que nós denominamos o ser-aí, a partir de cuja insistência se prepara o esfacelamento do primado do ente e, com isso, o in-habitual e o não-natural de uma outra origem da “arte”: o início de uma história velada do silenciamento de uma contraposição abissal dos deuses e do homem. [tr. Casanova; GA65: 277]


Submitted on 17.09.2023 12:49
This entry has been seen individually 532 times.

Bookmark to Fark  Bookmark to Reddit  Bookmark to Blinklist  Bookmark to Technorati  Bookmark to Newsvine  Bookmark to Mister Wong  Bookmark to del.icio.us  Bookmark to Digg  Bookmark to Google  Share with friends at Facebook  Twitter  Bookmark to Linkarena  Bookmark to Oneview  Bookmark to Stumbleupon Bookmark to StudiVZ

Powered by XOOPS © 2001-2012 The XOOPS Project