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Léxico Filosofia

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querer

Definition:
moegen; Wollen

Apegar-se a uma "coisa" ou "pessoa" em sua Essência, quer dizer: amá-la, querê-la. Pensando de modo mais originário, querer significa essencializar, dar Essência. Esse querer (moegen) é que constitui a própria Essência do poder, que não somente pode realizar isso ou aquilo mas também deixa uma coisa "vigorar" em sua pro-veniência, isto é, deixa que ela seja. O poder do querer é aquilo em cuja "força" uma coisa pode propriamente ser. Esse poder é o "possível" em sentido próprio, a saber, aquilo cuja Essência se funda no querer. É por esse querer que o Ser pode pensar. O Ser possibilita o pensar. Querer poderoso (das Vermoegend - Moegend), o Ser é o "possível". Como o elemento, o Ser é "a força silenciosa" do poder que quer, isto é, do possível. [CartaH]


A pergunta “o que é o ente?” procura pelo ser do ente. Para Nietzsche, todo ser é um devir. Todavia, esse devir tem o caráter da ação e da atividade do QUERER [Wollen]. Em sua essência, porém, a vontade é vontade de poder. Essa expressão nomeia aquilo que Nietzsche pensa quando apresenta a pergunta diretriz da filosofia. Por isso, esse título acaba por se impor como o título da obra central planejada que, em última instância, não foi realizada. O que se nos apresenta hoje como livro sob o título A vontade de poder contém trabalhos preliminares e elaborações fragmentárias para essa obra. O esboço fundamental do plano no qual esses fragmentos [5] são ordenados, a divisão em quatro livros e o título desses quatro livros também provêm do próprio Nietzsche. GA6MAC I

Nós ouvimos: o caráter fundamental do ente é vontade de poder, QUERER e, portanto, devir. E, contudo, Nietzsche não para justamente por aí, tal como habitualmente se pensa quando se associa Nietzsche com Heráclito. Ele diz muito mais em uma passagem proposta e expressamente formulada como uma visão conjunta que abarca todo o seu pensamento (A vontade de poder, n. 617): “Recapitulação: cunhar para o devir o caráter do ser – essa é a mais elevada vontade de poder!” Isso significa que o devir só é, quando ele é fundamentado no ser como ser: “Que tudo retorna é a aproximação mais extrema de um mundo do devir ao mundo do ser: – Ápice da consideração.” Com sua doutrina do eterno retorno, Nietzsche pensa à sua maneira o pensamento que permanece encoberto, mas que domina toda a filosofia ocidental como o pensamento propriamente impulsionador. Ele pensa o pensamento de tal modo que acaba por retornar com sua metafísica ao começo da filosofia ocidental – dito de maneira mais clara: ele acaba por retornar ao começo tal como a filosofia ocidental se habituou a vê-lo [15] no decurso de sua história. Esse é um hábito do qual Nietzsche comunga, apesar de sua apreensão de resto originária da filosofia pré-socrática. GA6MAC I

Em sua obra mais profunda, no tratado Sobre a essência da liberdade humana, publicado em 1809, Schelling escreveu o seguinte: “Não há em última e mais elevada instância nenhum outro ser senão o QUERER. O QUERER é o ser originário” (I, VII, 350). E Hegel concebeu em sua Fenomenologia do espírito (1807) a essência do ser como saber, mas o saber como sendo essencialmente idêntico ao QUERER. GA6MAC I

Mas tomemos agora antecipadamente o decisivo: o que Nietzsche mesmo compreende pela expressão “vontade de poder”? O que significa vontade? O que significa vontade de poder? Essas duas perguntas são, para Nietzsche, apenas uma; pois vontade não é para ele outra coisa senão vontade de poder, e poder não é outra coisa senão a essência da vontade. Vontade de poder é, então, vontade de vontade, ou seja, QUERER é: QUERER a si mesmo. No entanto, isso carece de elucidação. GA6MAC I

Não obstante, Nietzsche precisa dizer então reiteradamente o que é a vontade. Ele diz, por exemplo: a vontade é um “afeto”, a vontade é uma “paixão”, a vontade é um “sentimento”, a vontade é um “comando”. A caracterização da vontade como “afeto” e como coisas do gênero não fala, porém, a partir do âmbito da alma e dos estados anímicos? Afeto, paixão, sentimento e comando não são algo a cada vez diverso? Isso que é aqui aduzido para o esclarecimento da essência da vontade não precisa estar ele mesmo antes suficientemente claro? Ora, mas o que é mais obscuro do que a essência do afeto, da paixão e da diferença entre os dois? Como é que a vontade pode ser tudo isso ao mesmo tempo? É difícil suplantar essas questões e reservas ante a interpretação nietzschiana da essência da vontade. E, no entanto, elas talvez não toquem o que é efetivamente decisivo. Nietzsche mesmo acentua: “O QUERER parece-me antes de tudo algo complicado, algo que só é unidade como palavra – e justamente em uma palavra se esconde o preconceito popular, que se assenhorou do cuidado sempre muito diminuto dos filósofos” (Para além do bem e do mal, VII, 28). Nietzsche fala aqui antes de tudo contra Schopenhauer. De acordo com a opinião schopenhaueriana, a vontade é a coisa mais simples e mais conhecida do mundo. GA6MAC I

Se tentarmos tomar o QUERER em meio à peculiaridade que inicialmente como que se impõe, podemos dizer: QUERER é uma inclinação para…, um dirigir-se para algo…; QUERER é um comportamento dirigido para algo. Mas se visualizarmos imediatamente uma coisa simplesmente dada ou acompanharmos de modo observador o decurso de uma ocorrência, encontrar-nos-emos em um comportamento em relação ao qual vigora o mesmo: estamos dirigidos de forma [31] representativa para a coisa e aí não entra em jogo nenhum QUERER. Na mera consideração das coisas, não queremos nada “com” as coisas e “das” coisas, deixamos as coisas serem justamente as coisas que elas são. Estar dirigido para algo ainda não é um QUERER e, no entanto, reside no QUERER um tal estar-direcionado-para… GA6MAC I

Todavia, também podemos “QUERER” alguma coisa, por exemplo, um livro ou uma motocicleta. Um jovem “quer” ter uma coisa, isto é, gostaria de tê-la. Esse “gostaria-de-ter” não é nenhuma mera representação, mas um tipo de aspiração em direção a algo que possui o caráter particular do desejar. Ainda assim, porém, o desejar continua sendo diferente do QUERER. Quem quer que da maneira mais pura possível apenas deseje, esse justamente não quer. Ao contrário, ele espera que o desejado aconteça sem que tenha de fazer nada para tanto. Será, então, que o QUERER é um desejar com o acréscimo da própria iniciativa? Não – QUERER não é absolutamente desejar, mas QUERER é: colocar-se sob o próprio comando. QUERER é a decisão do comandar-se que em si mesma já é uma execução desse comando. Ora, mas com essa caracterização do QUERER introduzimos repentinamente uma série de determinações que inicialmente não tinham sido dadas com o que tínhamos visado, a saber, com aquele direcionar-se para algo. GA6MAC I

Parece, então, que a essência da vontade seria tomada da maneira mais pura possível se esse direcionar-se para… fosse destacado de modo pertinente como puro QUERER em contraposição ao direcionar-se para algo no sentido do mero cobiçar, do desejar, do aspirar ou do simples representar. A vontade é estabelecida aí como a pura relação do simples em direção a…, do dirigir-se para algo. Mas essa apreensão é um erro. Segundo a convicção nietzschiana, o equívoco fundamental de Schopenhauer é achar que há algo assim como um puro QUERER que é tanto mais puramente um QUERER quanto mais completamente aquilo que é querido é deixado indeterminado e quanto mais decididamente ele é excluído. Reside muito mais na essência da vontade o fato de que aqui aquilo que é querido e aquele que quer são coinseridos no QUERER, ainda que não no sentido extrínseco, de acordo com o qual também podemos dizer do aspirar que pertence ao aspirar algo que aspira e algo a que se aspira. GA6MAC I

A pergunta decisiva é justamente: como e em razão do que aquilo que é querido e aquele que quer pertencem no QUERER ao QUERER? Resposta: em razão do QUERER e por meio do QUERER. O QUERER quer o que quer como tal, e o QUERER estabelece o que é querido como tal. QUERER é decisão para si, mas para si como para o que o estabelecido no QUERER como querido quer. A vontade traz a cada vez a partir de si mesma uma determinação corrente para o interior do seu QUERER. Alguém que não sabe o que quer não quer absolutamente, e não pode QUERER de maneira alguma; não há um QUERER em geral: “pois a vontade é, como afeto do [32] comando, o sinal decisivo do autoassenhoramento e da força” (A gaia ciência, Livro V, 1886; V, 282). Em contrapartida, o aspirar pode ser indeterminado, tanto em consideração ao que é propriamente aspirado quanto em relação àquele que aspira. Em meio ao aspirar e ao impelir somos coinseridos em um movimento em “direção a…”, sem que nós mesmos saibamos o que está em jogo. Em meio ao mero aspirar a algo não somos propriamente trazidos para diante de nós mesmos, e, por isso, tampouco há aqui uma possibilidade de aspirarmos a para além de nós mesmos. Aspiramos aqui meramente e imergimos em uma tal aspiração. Por outro lado, a vontade é decisão para si – é sempre: QUERER para além de si. Se Nietzsche acentua em muitos aspectos o caráter de comando da vontade, então ele não designa uma prescrição e uma indicação para a realização de uma ação; ele também não visa ao ato de vontade no sentido de uma resolução, mas antes o pensa no sentido de uma decisão – aquilo por meio do que o QUERER pode se ligar ao que quer e ao que é querido, assim como essa ligação como decisividade fundada e permanente. Só é capaz de comandar verdadeiramente – o que não pode ser de modo algum equiparado com o mero dar ordens – quem não apenas está em condições de, mas quem está mesmo constantemente pronto a colocar a si mesmo sob o comando. Por meio dessa prontidão, ele coloca a si mesmo no âmbito do comando como o primeiro que normativamente obedece. Nesse caráter de decisão pelo qual o QUERER é lançado para além de si reside o ser-senhor sobre…, o exercer poder sobre o que é aberto no QUERER e é fixado nele, na decisão como algo apreendido. GA6MAC I

O QUERER mesmo é um assenhoramento sobre… que se estende para além de si; QUERER é em si mesmo poder. E poder é o QUERER que é constante em si. Vontade é poder e poder é vontade. Nesse caso, a expressão “vontade de poder” não tem nenhum sentido? Ela não tem, de fato, nenhum sentido logo que se pensa vontade em sintonia com o conceito nietzschiano de vontade. Apesar disso, contudo, Nietzsche se utiliza dessa expressão, rejeitando expressamente o conceito corrente de vontade e buscando especialmente enfatizar sua resistência ante o conceito schopenhaueriano de vontade. GA6MAC I

A expressão nietzschiana “vontade de poder” significa, consequentemente: vontade, tal como comumente se compreende esse termo, não é propriamente [33] outra coisa senão vontade de poder. Mas mesmo nessa explicitação reside ainda uma incompreensão possível. A expressão “vontade de poder” não diz, em sintonia com a opinião habitual, que a vontade é, em verdade, um tipo de desejo, que apenas possui, ao invés da felicidade e do prazer, o poder como meta. Sem dúvida alguma, Nietzsche mesmo fala em muitas passagens dessa forma, a fim de se fazer provisoriamente compreensível. No entanto, na medida em que estabelece o poder como meta para a vontade, ao invés da felicidade, do prazer ou da suspensão da vontade, ele não altera apenas a meta da vontade, mas a determinação essencial da própria vontade. Tomado estritamente no sentido do conceito nietzschiano de vontade, o poder nunca pode ser pressuposto previamente como meta para a vontade, como se o poder fosse algo que pudesse ser estabelecido inicialmente como estando fora da vontade. Porquanto a vontade é decisão por si mesma como um assenhoramento que se estende para além de si; porquanto a vontade é QUERER para além de si, a vontade é potencialidade que se potencializa para o poder. GA6MAC I

Como Nietzsche diz que o QUERER é um querer-para-além-de-si, ele pode dizer em vista desse estar-para-além-de-si-no-afeto que a vontade de poder é a forma originária do afeto. Todavia, Nietzsche também quer aduzir agora manifestamente o outro momento do afeto para o delineamento essencial da vontade, aquele abater-se sobre nós e aquele acometer-nos que tem lugar em meio ao afeto. Isso também, e justamente isso, pertence à vontade em um sentido, sem dúvida alguma, múltiplo que incessantemente se altera. Isso só é possível porque a vontade mesma – vista com relação à essência do homem – é o acometimento puro e simples que viabiliza em geral que nós, quer dessa ou daquela maneira, possamos estar e estejamos mesmo efetivamente para além de nós mesmos. GA6MAC I

A própria vontade nunca pode ser querida. Nunca podemos nos decidir a ter uma vontade, no sentido de que poderiamos nos arrogar uma vontade; pois toda decisão se mostra como o QUERER mesmo. Se dizemos que ele quer ter sua vontade levada a termo dessa ou daquela forma, então ter-vontade significa aqui tanto [37] quanto se encontrar propriamente em meio a seu QUERER, reter-se em toda a sua essência e ser senhor sobre ela. Precisamente essa possibilidade, porém, indica que sempre estamos no QUERER, mesmo se estivermos aí contra a nossa vontade. Aquele QUERER próprio que irrompe na decisão, aquele “sim” é o que promove o acometimento de toda a nossa essência, de todo o nosso ser em nós. GA6MAC I

O próprio Nietzsche não se envergonha de tomar o QUERER simplesmente como sentimento: “QUERER: um sentimento que compele, muito agradável! Ele é o epifenômeno de todo efluxo de força” (XIII, 159). QUERER – um sentimento de prazer? “Prazer é apenas um sintoma do sentimento do poder alcançado, uma consciência da diferença – (- ele [o vivente] aspira ao prazer: mas o prazer entra em cena quando ele alcança isso a que aspira: o prazer acompanha, o prazer não mobiliza)” (688). De acordo com isso, a vontade é, então, apenas um “epifenômeno” do efluxo de força, um sentimento de prazer que acompanha? Como isso se coaduna com o que foi dito no todo sobre a essência da vontade, e, em particular, a partir da comparação com o afeto e com a paixão? Lá a vontade veio à tona como o que suporta e domina propriamente, como equivalente ao próprio assenhorear-se; agora ela precisa ser rebaixada ao nível de um sentimento de prazer que simplesmente acompanha algo diverso? GA6MAC I

QUERER: um sentimento que compele, muito agradável!” Um sentimento é a maneira na qual nos encontramos em nossa ligação com o ente, e, com isso, também ao mesmo tempo em nossa ligação conosco mesmo; a maneira como nos encontramos afinados em relação ao ente que nós mesmos não somos e em relação ao ente que nós mesmos somos. No sentimento abre-se e mantém-se aberto o estado no qual nos encontramos concomitantemente em relação às coisas, em relação a nós mesmos e em relação aos homens que convivem conosco. O sentimento é efetivamente esse estado aberto para si mesmo, no qual nossa existência se agita. O homem não é um ser pensante que também quer e que, além disso, teria sentimentos acrescentados ao pensar e ao QUERER – e isso com a finalidade de embelezamento ou de embrutecimento. Ao contrário, o estado do sentimento é originário, mas o é de tal modo que a ele compertencem o pensar e o QUERER. A única [41] coisa importante agora é ver que o sentimento tem o caráter do abrir e do manter aberto, e, por isso, sempre à sua maneira, também o caráter do fechamento. GA6MAC I

No entanto, se a vontade é um querer-para-além-de-si, então reside nesse para-além-de-si-mesmo o fato de a vontade não se estender simplesmente para fora de si, mas se inserir concomitantemente no QUERER. O fato de aquele que quer QUERER se inserir em sua vontade significa: no QUERER torna-se manifesto o QUERER e, juntamente com ele, aquele que quer e aquilo que é querido. Na essência da vontade, na de-cisão, reside o fato de a vontade descerrar a si mesma. Portanto, ela não possui esse caráter apenas por meio de um comportamento que se lhe acrescenta, por meio de uma observação do processo da vontade e de uma reflexão quanto a isso, mas a vontade mesma tem muito mais o caráter do manter aberto que abre. Por mais penetrantes que sejam, uma auto-observação e uma autoanálise instauradas arbitrariamente nunca trazem à tona nosso si próprio e o modo como as coisas se encontram em relação a ele. Em contrapartida, trazemos nós mesmos à luz em meio ao QUERER e, correspondentemente, também em meio ao não QUERER; e, em verdade, trazemos nós mesmos a uma luz que é acesa pela primeira vez por meio do próprio QUERER. QUERER é sempre um trazer-se-a-si-mesmo, e, com isso, um encontrar-se em meio ao para-fora-de-si, um manter-se no ímpeto para fora de algo e em direção a algo. Dessa forma, a vontade tem aquele caráter do sentimento, do manter aberto o estado mesmo. Junto ao QUERER – junto a essa dinâmica para-fora-de-si esse estado é um compelir. Com isso, a vontade pode ser tomada como um “sentimento que compele”. Ela não é apenas o sentimento de algo que compele. Ao contrário, ela mesma é algo que compele, e mesmo algo “muito agradável”. O que se abre na vontade – o QUERER mesmo como de-cisão – é agradável àquele para o qual ele se abre, é agradável para aquele mesmo que quer. No QUERER vamos ao encontro de nós mesmos como aqueles que propriamente somos. Somente na própria vontade capturamos a nós mesmos em nossa essência mais própria. Aquele que quer é como tal aquele que-quer-para-além-de-si; no QUERER sabemos que nós mesmos estamos voltados para fora de nós; nós sentimos de algum modo um ser senhor sobre…; um prazer dá a saber o poder que foi alcançado e que se eleva. Por isso, Nietzsche fala de uma “consciência da diferença”. GA6MAC I

[42] Se aqui o sentimento e a vontade são tomados como uma “consciência”, como um “saber”, então se mostra aí da forma mais incisiva possível aquele momento da abertura de algo no interior da própria vontade. No entanto, a abertura não é nenhuma consideração, mas um sentimento. Isso diz: o QUERER mesmo é um tipo de estado, ele se encontra aberto para e em si mesmo. QUERER é sentimento (um estado como um estar afinado). Na medida em que a vontade mesma tem, contudo, aquela pluralidade de figuras já indicada que é intrínseca ao querer-para-além-de-si; e na medida em que tudo isso se torna manifesto na totalidade, pode-se constatar o seguinte: na vontade esconde-se uma multiplicidade de sentimentos. É o que nos diz Nietzsche em Para além do bem e do mal: “em todo QUERER há, primeiramente, uma multiplicidade de sentimentos: o sentimento de um estado do qual saímos, o sentimento de um estado para o qual tendemos, o sentimento dessa ‘saída’ e dessa ‘tendência’, então ainda um sentimento muscular paralelo que se coloca em jogo por meio de um tipo de hábito, mesmo quando não movemos ‘pernas e braços’”. GA6MAC I

QUERER é um tipo de desejar e de aspirar. Os gregos denominam isso orexis; na Idade Média e na modernidade isso significa: appetitus e inclinatio. Uma mera aspiração e um mero ímpeto é, por exemplo, a fome: um ímpeto para a comida e em vista da alimentação. No caso do animal, esse ímpeto mesmo enquanto tal não tem propriamente em vista isso em direção ao que ele impele; animais não representam a alimentação como tal e não aspiram a ela como alimentação. A aspiração não sabe o que quer porque ela não quer absolutamente, e, no entanto, está disposta para o que é aspirado; a questão é que ela nunca está disposta para ele como um tal. Todavia, a vontade como aspiração não é nenhum ímpeto cego. O desejado e aspirado é como tal correpresentado, tomado concomitantemente em vista, coapreendido. GA6MAC I

Levar algo adiante por meio da representação e meditar sobre ele recebe em grego o nome de voeiv. O aspirado, orekton, é em meio ao QUERER algo ao mesmo tempo representado, noeton. Isso jamais significa, porém, que o QUERER é propriamente um representar, de modo que seria anexado posteriormente ao [44] representado algo assim como uma aspiração. O que se dá é muito mais o inverso. Podemos citar como prova inequívoca disso uma passagem de Aristóteles retirada do tratado Peri psyches, Sobre a alma. GA6MAC I

Se se compreende por uma interpretação idealista da vontade toda e qualquer concepção que acentua em geral a representação, o pensamento, o saber, o conceito como essencialmente pertinente à vontade, então certamente a interpretação aristotélica da vontade é idealista. Do mesmo modo, são idealistas as concepções de Leibniz e de Kant; e, então, também a concepção de Nietzsche. É fácil apresentar uma prova para essa afirmação; só precisamos prosseguir na leitura imediatamente subsequente da passagem em que Nietzsche diz que a vontade consiste em uma multiplicidade de sentimentos: “Assim como o sentir, e, em verdade, o sentir multifacetado, precisa ser reconhecido como um ingrediente da vontade, o pensamento também precisa ser reconhecido em um segundo momento: em todo ato de vontade há um pensamento que comanda. E não se deve acreditar na possibilidade de cindir esse pensamento do ‘QUERER’, como se a vontade então restasse!” (VII, 29). GA6MAC I

Em face desses claros enunciados nietzschianos, não se consegue ver o que poderia trazer uma rejeição da interpretação idealista de sua doutrina da vontade. Todavia, talvez se pense que a concepção nietzschiana da vontade não é aquela do idealismo alemão. No idealismo também, contudo, assume-se o conceito kantiano e aristotélico de vontade. Para Hegel, saber e QUERER são o mesmo. Isso significa: o saber verdadeiro já é também agir, e o agir só é no saber. Schelling chega mesmo a dizer: o que quer propriamente na vontade é o entendimento. Não se está diante de um idealismo inequívoco quando se tende a compreender por isso [46] uma recondução da vontade à representação? No entanto, Schelling não quer outra coisa em meio a essa construção linguística extravagante senão acentuar o que Nietzsche traz à tona na vontade quando diz: a vontade é um comando; pois quando Schelling diz “entendimento” e o idealismo alemão fala em saber, o que se tem em vista não é a faculdade da representação, como imagina a psicologia, ou seja, não é nenhum comportamento que apenas acompanharia contemplativamente os outros processos da vida psíquica. Saber significa: abertura para o ser que é um QUERER – na linguagem de Nietzsche, um “afeto”. Nietzsche mesmo diz: “QUERER é comandar: porém, comandar é um determinado afeto (esse afeto é uma repentina explosão de força) – tenso, claro, visar exclusivamente a uma coisa, a convicção mais íntima possível de sua superioridade, certeza de que é obedecido.” Ter em vista claramente uma única coisa, estar tensamente ligado a ela, tê-la exclusivamente em vista: o que seria isso senão manter uma coisa – no sentido mais estrito da palavra – diante de si, re-presentá-la; entendimento, contudo, diz Kant, é a faculdade da representação. GA6MAC I

Nenhuma caracterização da vontade é mais frequente em Nietzsche do que a que acaba de ser citada: QUERER é comandar; na vontade reside o pensamento que comanda; nenhuma outra concepção da vontade, contudo, acentua mais decididamente do que essa também a essencialidade do saber e da representação na vontade. GA6MAC I

Para evitar, então, desde o início a vacuidade da palavra “vontade”, Nietzsche diz: “vontade de poder”. Todo QUERER é um querer-ser-mais. O poder mesmo só é na medida em que e porquanto ele permanece um querer-ser-mais-poder. Logo que essa vontade se interrompe, o poder deixa de ser mais poder, ainda que ele mantenha o dominado sob a sua sujeição. Na vontade como querer-ser-mais, na vontade como vontade de poder, reside essencialmente a intensificação, a elevação; pois somente em meio à elevação constante é possível manter elevada e em cima a própria altura. Somente uma elevação mais poderosa pode fazer com que se escape da tendência para o declínio. Uma mera retenção da altura até aqui alcançada não é capaz de impedir uma tal tendência, porque essa retenção tem por fim como consequência a exaustão. Nietzsche diz em A vontade de poder (n. 702): “o que o homem quer, o que cada mais mínima parte de um organismo vivente quer é um plus de poder”. / [48] “Tomemos o exemplo mais simples, o exemplo da alimentação primitiva: o protoplasma estende seus pseudópodes para procurar por algo que se lhe contraponha – não por fome, mas por vontade de poder. Então, ele tenta superá-lo, apropriar-se dele, incorporá-lo: – O que se denomina alimentação’ é meramente um fenômeno secundário, uma aplicação prática daquela vontade originária de se tornar mais forte.” GA6MAC I

QUERER é querer-ser-mais-forte. Nietzsche também fala aqui por inversão e a partir de uma oposição ao mesmo tempo ao espírito de seu tempo, a saber, em oposição ao darwinismo. Elucidemos tal estado de coisas brevemente: a vida não tem apenas, como pensava Darwin, o ímpeto para a autoconservação, mas é ela mesma autoafirmação. O querer-conservar-se não se atém senão ao que já se encontra simplesmente dado, ele se enrijece aí, se perde nele e fica assim cego em relação à sua própria essência. Autoafirmação, ou seja, o QUERER continuar dirigindo as coisas, ou seja, QUERER permanecer em cima, é constantemente um retornar à essência, à origem. Autoafirmação é afirmação originária da essência. GA6MAC I

Ser artista é uma forma de vida. O que Nietzsche diz acerca da vida em geral? Ele denomina “a vida a forma mais conhecida do ser” (n. 689). “Ser” mesmo só é válido para ele “como universalização do conceito ‘vida (respirar), ‘ser animado’, ‘QUERER, atuar’, ‘devir’” (n. 581). “O ser – nós não temos nenhuma outra representação dele senão ‘viver. Como é que algo morto poderia ‘ser’?” (n. 582). “Se a essência maximamente íntima do ser for vontade de poder…” (n. 693). GA6MAC I

Precisamos nos contentar, aqui, com uma indicação que permanece limitada por nosso modo diretriz de colocação da questão. Em relação à posição histórica da arte, o empenho pela “obra de arte integral” permanece essencial. Já o nome é significativo. Ele diz, por um lado: as artes não devem mais se realizar de maneira justaposta, mas devem ser coligidas em uma obra. No entanto, para além dessa unificação pensada mais em termos numéricos e quantitativos, a obra de arte deve ser uma festa da comunidade popular: “a” religião. As artes normativas são, nesse contexto, a poesia e a música. Segundo o seu intuito, a música deve ser um meio para tornar válido o drama; na realidade, porém, sob a figura da ópera, a música se torna a arte propriamente dita. O drama não tem seu peso e sua essência na originariedade poética, ou seja, na linguagem que é cunhada para a obra linguística, mas no elemento cênico das apresentações e das produções de gala. A arquitetura serve apenas à construção do teatro, a pintura fornece as coulisses, a escultura auxilia a apresentação dos gestos dos atores. Poesia e linguagem permanecem sem a força essencial e decisivamente configuradora do saber propriamente dito. O domínio da arte como música é almejado, e, com isso, o domínio do puro estado sentimental: o delírio e o ardor dos sentidos, a grande batalha, o horror bem-aventurado do amalgamar-se no gozo, a imersão no “mar sem solo das harmonias”, a submersão na embriaguez, a dissolução no puro sentimento como redenção; “a vivência” como tal torna-se decisiva. A obra só continua sendo estimuladora de experiências vitais. Tudo o que precisa ser apresentado deve apenas atuar como primeiro plano e como primeira face, tendo por meta a impressão, o efeito, o QUERER produzir um efeito e comover: “teatro”. Teatro e orquestra determinam a arte. Wagner diz da orquestra: “A orquestra é, por assim dizer, o solo de um sentimento infinito, universalmente comum, a partir do qual o sentimento individual do artista singular pode crescer e [70] alcançar a sua plenitude suprema: ela dissolve o solo rígido, imóvel, da cena real, e o projeta em certa medida para o interior de uma superfície fluida, tenra e flexível, uma superfície impressionável, etérea, cujo fundamento imensurável é o mar do próprio sentimento” (Das Kunstwerk der Zukunft – A obra de arte do futuro. Gesammelte Schriften und Dichtungen, 2. ed., p. 157; 1887). GA6MAC I

Por meio daí, a posição fundamental de Nietzsche em relação à arte como realidade histórica é determinada de maneira mais próxima, e, juntamente com isso, o modo de seu conhecimento e de seu QUERER conhecer a arte: a estética como fisiologia aplicada. No entanto, as duas coisas estão subordinadas ao grande contexto da história da arte em sua ligação com o saber respectivo sobre ela. GA6MAC I

No âmbito dos processos naturais concebidos em termos de ciências positivas, onde sempre predomina a lei do decurso e da compensação ou descompensação [75] das relações de causa-efeito, toda ocorrência é, igualmente, essencial e não essencial; não há nessa região nenhuma ordenação hierárquica e nenhum estabelecimento de critérios; tudo é como é, permanece o que é e tem seu direito simples no fato de ser. A fisiologia não conhece nenhum âmbito no qual algo pudesse ser estabelecido como um parâmetro de decisão e escolha. Entregar a arte à fisiologia parece o mesmo que rebaixar a arte ao plano do funcionamento do estômago. Como é que a arte poderia, então, determinar e fundamentar ao mesmo tempo a avaliação propriamente dita e decisiva? Tomar a arte como contramovimento em relação ao niilismo e como objeto da fisiologia significa: QUERER misturar fogo e água. Se ainda é aqui possível efetivamente um acordo, então somente na medida em que a arte como objeto da fisiologia não for explicada como o contramovimento, mas, sim, como o movimento central mais extremo do próprio niilismo. GA6MAC I

Mas, o que Kant tem em vista com aquela determinação do belo como o objeto do deleite “desinteressado”? O que significa “desprovido de todo interesse”? Interesse é uma palavra que remonta ao latim mihi interest, algo possui uma importância para mim; tomar um interesse por algo diz: QUERER ter algo para si, a saber, QUERER se apossar de algo, QUERER empregá-lo e colocá-lo à sua disposição. Quando tomamos um interesse por algo, nós o estabelecemos em vista de algo que queremos empreender e a que, com isso, aspiramos. Isso pelo que tomamos um interesse é sempre tomado, representado já em vista de algo diverso. GA6MAC I

Todavia, em relação à apresentação da concepção nietzschiana da beleza, o aceno em direção a Kant não deve apenas afastar a interpretação equivocada e solidamente enraizada da doutrina kantiana. Ao contrário, deve dar também a possibilidade de que o que Nietzsche mesmo diz sobre a beleza seja concebido a partir de seu contexto histórico originário. O fato de o próprio Nietzsche não ver esse contexto é um limite que ele compartilha com seu tempo e com a relação desse tempo com Kant e com o idealismo alemão. Da mesma forma como seria indesculpável QUERER deixar a errônea interpretação dominante da estética kantiana continuar persistindo, também seria errado tentar reconduzir a concepção nietzschiana da beleza e do belo à concepção kantiana. O que precisamos fazer é muito mais deixar brotar a determinação nietzschiana do belo a partir de seu próprio solo e ver nesse contexto para o interior de que discordância ela é transposta. GA6MAC I

Com efeito, as coisas assumem, inicialmente, a aparência de que podemos simplesmente equiparar “estilo clássico” e “grande estilo”. Todavia, estaríamos pensando de maneira muito curta se quiséssemos dar conta desse estado de coisas nessa forma corrente. Certamente, o próprio teor imediato das sentenças nietzschianas parece mesmo falar a favor dessa equiparação. Não obstante, a ideia decisiva não seria pensada em meio a um tal procedimento: justamente porque o grande estilo é um QUERER doador e afirmativo em relação ao ser, sua essência só se desentranha quando se leva até a decisão, e, em verdade, por meio do grande estilo mesmo, o que significa o ser do ente. Somente a partir daí se determina o jugo em cuja base o elemento contraditório é tencionado. Todavia, a essência do grande estilo se dá, inicialmente, em primeiro plano na descrição do clássico. Nietzsche mesmo nunca se expressou de outra maneira quanto a isso; pois todo grande pensador sempre pensa um salto mais originariamente do que ele imediatamente fala. Por isso, a interpretação precisa tentar dizer o que não está dito. GA6MAC I

Não obstante, gostaríamos de abrir primeiramente caminho até esse âmbito metafísico através da essência da arte. É possível que tenha ficado mais claro agora por que partirmos da arte ao questionarmos a posição metafísica fundamental de Nietzsche, assim como o fato de esse ponto de partida não ser nenhum ponto de partida arbitrário. O grande estilo é o sentimento supremo de poder. A arte romântica, emergente da insatisfação e da deficiência, é um querer-evadir-se-de-si. QUERER, contudo, segundo sua essência propriamente dita, é querer-a-si-mesmo. No entanto, nunca a “si mesmo” como aquele que se acha apenas simplesmente dado e subsistente justamente desse modo, mas a “si mesmo” como isso que pela primeira vez quer vir a ser o que é. O QUERER propriamente dito não é um evadir-se-de-si, mas muito mais um lançar-se para além de si; e nesse exceder-se a vontade captura precisamente o querente e o insere concomitantemente em si, transformando-o. Dessa forma, querer-evadir-se-de-si é, no fundo, um não QUERER. Em contrapartida, onde quer que o supérfluo e a plenitude, isto é, a manifestação autodesdobradora da essência, trazem a si mesmos sob a lei do simples, o QUERER quer a si mesmo em sua essência, ou seja, é vontade. Essa vontade é vontade de poder; pois poder não é coerção e violência. O autêntico poder ainda não se faz presente onde ele precisa simplesmente manter a sua posição em resposta à ameaça de algo que ainda não foi neutralizado. O poder só se faz presente onde vigora a simplicidade da quietude por meio da qual o contraditório é mantido, ou seja, é transfigurado na unidade do jugo que sustenta um arco. GA6MAC I

Como pressuposição, permanece inalterado: toda arte é mimesis. Traduzimos essa palavra por “imitação”. No começo do Livro X pergunta-se: O que é a mimesis? Somos facilmente tentados a QUERER encontrar aqui, ao mesmo tempo, uma representação “primitiva” da arte, ou mesmo uma representação unilateral no sentido de uma direção da arte que se chama “naturalismo”, arte como a cópia do que está simplesmente dado. Precisamos manter de antemão longe daqui essas duas opiniões prévias. Mas ainda mais equivocada é a opinião de que é uma pressuposição arbitrária tomar a arte como mimesis; pois, justamente por meio da iluminação da essência da mimesis, que é levada a termo no Livro X, não se busca elucidar apenas a palavra, mas também a coisa denominada em vista de sua possibilidade interna, devendo ser perseguidos, em um movimento retrospectivo, os seus fundamentos de sustentação. Estes não são outros senão as representações fundamentais dos gregos em relação ao ente como tal, sua compreensão de ser. Uma vez que a pergunta sobre a verdade é irmanada com a pergunta sobre o ser, o conceito grego de verdade se encontra na base da interpretação da arte como mimesis. Somente sobre esse solo, a mimesis tem sentido e peso, assim como é somente sobre esse solo que ela tem sua necessidade. Essa indicação é necessária, [138] para que fixemos ao mesmo tempo o campo de visão correto para as discussões seguintes. Depois de uma tradição de mais de dois mil anos e de um certo hábito de pensamento e de representação, o que é debatido aí quase não é mais para nós do que um conjunto de lugares-comuns. Todavia, se considerarmos as coisas a partir do tempo de Platão, tudo se mostra como uma primeira descoberta e como um dizer normativo. Para corresponder à atmosfera desse diálogo, é bom colocarmos de lado, por um tempo, nossa perspicácia aparentemente maior e o que “já” sabemos como elemento que nos confere uma certa superioridade. Certamente precisamos abdicar aqui de percorrer completamente toda a sequência de passos singulares do diálogo. GA6MAC I

O que aconteceria se o deus deixasse emergir para uma coisa e para a sua multiplicação – casa e casas, árvore e árvores, animal e animais – muitas ideias? Resposta: [citação em grego]. “Se ele, ao invés de uma única ‘ideia’ casa, tivesse deixado emergir mesmo que apenas duas, então uma única apareceria uma vez mais, cujo aspecto as duas precisariam ter novamente como seu, e a quididade da cama ou da casa seria uma vez mais esse um, não as duas.” Portanto, essa unidade e essa unicidade pertencem à essência da idea. Onde reside, então, segundo Platão, o fundamento para a respectiva unicidade da ideia (da essência)? Não no fato de, quando duas ideias são postas, elas se deixarem ultrapassar por uma mais elevada do que elas, mas no fato de o deus, na medida em que sabia desse ultrapassar-se da representação a partir de uma multiplicidade em direção a uma unidade, [citação em grego] (597d) – “QUERER ser o produtor essencializante da coisa essencializante, não de uma coisa singular qualquer, e não alguém como um construtor de suportes”. Como o deus queria ser um tal deus, ele deixa, por exemplo, as camas “virem à tona na unidade e unicidade da essência”. Sobre o que está fundada então, em última análise, para Platão, a essência da ideia, e, com isso, do ser? Sobre o estabelecimento de um criador cuja essencialidade só se mostra como salva se sua criatura for algo a cada vez único, uno, com o que se tenha ao mesmo tempo em conta aquela ultrapassagem da representação de um múltiplo na representação de seu uno. GA6MAC I

Mas esse saber não é saber algum. Quando Zaratustra o denomina assim, só está dizendo ironicamente que eles não sabem de nada. Eles não passam de realejos, rapidamente transformam em modinha de realejo a palavra conquistada a partir de sua dureza, giram a manivela e como o anão não sabem nada sobre o que há de essencial. Pois ele desapareceu quando as coisas ficaram sérias e ruins, quando o pastor precisou arrancar a cabeça da negra serpente. O anão não chegou a experimentar nada quanto à equivalência entre saber realmente o anel dos anéis e superar de antemão e constantemente aquele negro e horrível que [216] se expressa na doutrina: o fato de, se tudo retorna, toda decisão, todo empenho e todo anseio de ascensão serem indiferentes; o fato de, se tudo gira em círculos, nada valer a pena; o fato de só resultar dessa doutrina então o enfado, e, por fim, o não à vida. Apesar do belo discurso sobre o anel do ser, mesmo os seus animais parecem dançar para além do essencial. Mesmo os seus animais parecem QUERER tomar a doutrina como os homens: eles se evadem como o anão, ou, contudo, apenas contemplam sua doutrina e narram o que se dá quando tudo gira em círculos; eles se encarapitam diante do ente e o descrevem nas mais belas imagens. Eles não pressentem o que se dá aí, o que precisa ser pensado no pensamento verdadeiro do ente na totalidade: o fato de esse pensamento ser um grito provindo do fundo de uma penúria. GA6MAC II

Se tocamos com essa interpretação o cerne do pensamento nietzschiano enquanto um pensamento metafísico, então tudo se torna realmente questionável. Estabelecer a essência do mundo em termos do caráter fundamental do eterno retorno do mesmo é, caso esse caráter fundamental não seja descerrado a partir da totalidade do mundo, mas atribuído e conferido primeiramente a essa totalidade, algo puramente arbitrário; e, nesse sentido, tem-se aqui, em uma medida extrema, aquilo mesmo que Nietzsche queria evitar: a humanização do ente. A proveniência do pensamento do retorno não se mostrou a partir da experiência do instante como a posição maximamente humana em relação ao tempo? Nietzsche não apenas introduz, com isso, uma experiência humana no ente na totalidade, mas também age, ao mesmo tempo, em contradição consigo mesmo ao QUERER evitar a humanização. Visto como um todo, ele permanece sem ter clareza quanto ao seu próprio procedimento em um aspecto decisivo, e isso não parece muito auspicioso para um filósofo, especialmente para um filósofo tão exigente quanto Nietzsche. Nietzsche não deveria saber que estava “inserindo uma interpretação nas coisas”? GA6MAC II

Sob a luz do pensamento do retorno é preciso que se decida quem possui e quem não possui a força e a tonalidade afetiva requeridas para se reter na verdade. Aqueles que não “acreditam” nele são os “fugidios”. Nietzsche tem em vista duas coisas com essa noção: por um lado, os fugidios estão constantemente em fuga ante as longas e grandes visadas que exigem uma capacidade de esperar. Eles querem que a felicidade mais imediata esteja ao alcance das mãos e querem o tempo para que possam se sentir bem aí. Como aqueles que fogem, contudo, eles são os fugidios ainda em um outro sentido: eles mesmos não possuem nenhuma subsistência constante, são aqueles que estão sempre de passagem, que não deixam nenhum rasto, que não fundam nem instituem nada. Os outros, os não fugidios, são “os homens com almas eternas, devir eterno e aptos aos sofrimentos futuros”. Também podemos dizer: os homens que carregam muito tempo em si e que vivem projetando-se para tempos distantes, homens que são independentes da duração real de suas vidas. Ou ainda com uma outra formulação: os homens fugidios são justamente aqueles que estão menos aptos para serem os homens da transição propriamente ditos; e isso por mais que a aparência fale o contrário, uma vez que “transição” significa desaparecimento. Os fugidios que não pensam e não podem pensar o pensamento “precisam, em razão de sua própria natureza, desaparecer! / Só quem toma a sua existência como capaz de eterna repetição permanecerá: entre esses, porém, é possível um estado que ainda não foi alcançado por nenhum utopista!” (n. 121). / “Quem não crê tem uma vida fugidia em sua consciência” (n. 128). [277] O pensamento mais pesado é aqui concebido como o pensamento que traz um outro pensamento; não são apenas outras ocorrências que emergem, o próprio modo de ser do acontecimento, da ação e da criação se transforma. A cor, o aspecto, a presença, o ser: tudo muda. O “amarelo profundo” e o “vermelho ardente” vêm à tona. Ora, mas não é preciso levar finalmente em consideração nesse ponto uma questão capaz de dissolver tudo, toda a essência desse pensamento, como uma bolha de sabão? Se tudo é necessário, o mundo e o caos da necessidade, se tudo retorna tal como já foi, então todo pensamento e toda construção de planos se tornam supérfluos. Sim, eles se tornam até mesmo de antemão impossíveis: tudo se dá aqui como se dá. Nesse caso, tudo é indiferente, e o pensamento, ao invés de ser um peso (um fiel da balança), retira de nós toda carga e toda gravidade da decisão e da ação, todo sentido do planejar e do QUERER, amarrando-nos ao curso de um eterno circuito que necessariamente corre por si mesmo. O pensamento abre, em suma, ao mesmo tempo, todas as ruas para o arbitrário e para a ausência de leis, deixando-nos, por fim, mergulhar na pura inação e no abandono de todas as coisas ao seu próprio movimento escorregadio. Além disso, esse pensamento não seria nenhum “novo” peso, mas um peso muito antigo. Pois foi esse peso muito antigo que fez com que a história da Antiguidade ficasse soterrada e terminasse em fatalismo. GA6MAC II

Mas sabemos afinal o que se deu? Não! Podemos saber de alguma forma? Não sabemos nada sobre uma vida anterior. Tudo o que estamos vivendo agora é experimentado pela primeira vez, apesar de por vezes cintilarem por entre as nossas experiências mais cotidianas aquele elemento estranho e obscuro, aquela experiência: o que tu estás experimentando agora, e, em verdade, exatamente como tudo se dá agora, tu já experimentaste uma vez. Não sabemos nada sobre uma vida anterior quando o nosso pensamento se lança para trás. Todavia, será que só podemos lançar o nosso pensamento para trás? Não, também podemos projetar o pensamento para a frente: e esse é o pensamento propriamente dito. Nesse pensamento conseguimos de certa maneira saber o que se deu. Curioso – ao pensarmos para a frente devemos experimentar algo sobre o que ficou para trás? Com certeza. O que já se deu afinal e o que retornará quando o que já se deu retornar? Resposta: o que será no próximo instante. Se tu deixares a existência deslizar para o interior da covardia e da ignorância, com todas as consequências que essas coisas trazem consigo, então essas consequências retornarão e elas serão aquilo que já se deu. E se tu configurares um instante supremo a partir do próximo instante e assim a partir de todos os instantes, assinalando e firmando por meio daí as consequências, então esse instante retornará e terá sido o que já era: “a eternidade prevalece”. No entanto, essa eternidade só será decidida em teu instante e a partir do que tu mesmo tomas pelo ente e como tu te reténs nele – a partir do que tu queres e podes QUERER para ti mesmo. GA6MAC II

[281] Entrementes um grande minuto do tempo. Portanto, no tempo-entre há de qualquer modo um tempo, “um grande minuto”! No entanto, essa afirmação não contradiz a anterior. Ao contrário, ela reúne e integra os dois modos de consideração supracitados. Um minuto do tempo ante os bilhões de anos objetivamente calculados é o mesmo que tempo nenhum; e “um grande minuto” deve indicar concomitantemente que se reuniram entrementes todas as condições do vir-a-ser-uma-vez-mais e do retorno – “todas as condições a partir das quais tu vieste a ser”. A condição decisiva não está aqui certamente denominada: essa condição é tu mesmo – o modo segundo o qual tu alcanças o teu si próprio, na medida em que tu te tornas senhor sobre ti mesmo, na medida em que tu, na vontade essencial, agregas a ti mesmo na vontade e alcanças, assim, a liberdade. Só somos livres no momento em que nos tornamos livres, e só nos tornamos livres por meio de nossa vontade. É assim que se acha formulado na segunda parte de Assim falou Zaratustra (1883), no capítulo “Da ilha dos bem-aventurados”, n. 2: “O QUERER liberta: essa é a verdadeira doutrina da vontade e da liberdade – é assim que Zaratustra a ensina a vós.” GA6MAC II

A fim de configurar a filosofia assim planejada em uma obra central, empreende-se agora uma interpretação de todo acontecimento como vontade de poder. Essa consideração é essencial e ganha para Nietzsche, nos próximos anos, a posição central que determina todos os entes eles mesmos. A doutrina do eterno retorno não é nem um pouco excluída nem tampouco diminuída em sua significação. Ao contrário, é muito mais levada ao extremo pelo fato de Nietzsche QUERER assegurar por todos os lados da maneira mais fundamental possível o edifício central por meio da “interpretação de todo acontecimento”. O ano 1885 encerra ainda anotações (XVI, 415) nas quais é dito claramente o que Nietzsche compreende pela “vontade de poder” que assume agora o primeiro plano do trabalho: “Vontade de poder é o último fato ao qual se pode aceder.” GA6MAC II

A vontade de poder pode ser um “pressuposto” para o eterno retorno do mesmo: 1. Porquanto o eterno retorno do mesmo pode ser demonstrado a partir da vontade de poder como o caráter de força da totalidade do mundo. A vontade de poder seria, então, o fundamento do cognitivo para o eterno retorno do mesmo. 2. Porquanto o eterno retorno só é possível se a constituição da vontade de poder for própria ao ente como tal. A vontade de poder seria, assim, o fundamento objetivo para o eterno retorno do mesmo. 3. Porquanto a constituição do ente (a sua quididade, a quiditas, essentia) fundamenta o modo de ser (o seu “como” e o seu “que”, a existentia). Na medida em que a relação supracitada entre a constituição do ente e o modo de ser permanece indeterminada, subsiste também a possibilidade de que a constituição do ente venha à tona inversamente do modo de ser. A relação não pode ser determinada por meio da ligação entre um condicio-nante e um condicionado, entre um fundante e um fundado. Para determinar essa relação é preciso explicitar previamente a proveniência essencial da essência do ser. Com essas perguntas, já estamos antecipando alguns passos decisivos da interpretação e determinação da relação entre o eterno retorno do mesmo e a vontade de poder. Podemos avaliar, a partir da consideração de uma circunstância aparentemente extrínseca, até que ponto essa relação enquanto uma relação obscura e não apreensível pelo próprio Nietzsche perfez, porém, para ele, precisamente em seu último período criativo, a inquietude propriamente dita de seu pensar. O fragmento de n. 1.067, que, segundo a ordenação atual do texto, se acha no final de toda a “obra” A vontade de poder, é, tal como ele se encontra diante de nós agora, a reelaboração de uma versão anterior (XVI, 515). Nietzsche responde à pergunta “E vós também sabeis o que é para mim b mundo’?” da seguinte maneira na primeira versão do fragmento: ele é eterno retorno do mesmo, QUERER para trás o que quer que tenha sido e QUERER para a frente o que precisa ser. Na segunda versão, ele nos diz: “Esse mundo é vontade de poder – e nada além disso!” GA6MAC II

Uma vez mais nos vemos diante de uma questão que já veio ao nosso encontro muitas vezes: a questão acerca de se queremos permanecer presos apenas à diferença extrínseca do conteúdo literal das sentenças e dos termos “eterno [300] retorno do mesmo” e “vontade de poder” – ou se sabemos que uma filosofia só é concebível quando tentamos pensar o que foi dito por ela. Em todo caso, a reelaboração mencionada mostra que a vontade de poder e o eterno retorno do mesmo se compertencem; se as coisas não fossem assim, com que direito se poderia substituir um termo pelo outro? Mas, e se a vontade de poder no sentido mais próprio e intrínseco a Nietzsche não fosse em si mesma outra coisa senão o QUERER para trás o que foi e o QUERER para a frente o que precisa ser? E se o eterno retorno do mesmo como acontecimento não fosse outra coisa senão vontade de poder, do modo em verdade como Nietzsche compreende esse termo e não como um ponto de vista “político” qualquer dispõe dele em função de seus próprios propósitos? Nesse caso, a caracterização do ente como vontade de poder seria apenas o desdobramento do projeto original e primário do ente enquanto eterno retorno do mesmo. E é assim que as coisas se dão efetivamente. GA6MAC II

O ente na totalidade é vontade de poder. Como tal, a vontade de poder é o princípio de uma nova instauração de valores. Mas o que significa, afinal, “vontade de poder”? Compreendemos sem dúvida alguma o que “vontade” significa, uma [347] vez que experimentamos algo desse gênero em nós mesmos, seja no QUERER, seja mesmo no não QUERER. Também temos igualmente uma ideia aproximada do que se pensa com o termo “poder”. Com isso, a expressão “vontade de poder” também parece clara. Todavia, nada seria mais pernicioso do que se quiséssemos seguir as nossas representações habituais do dia a dia sobre a “vontade de poder” e então achar que sabemos por meio daí algo sobre o pensamento único de Nietzsche. GA6MAC III

De maneira aguçada e exagerada, Nietzsche expressa com frequência essa ideia de uma forma que facilmente induz em erro: “- não há nenhuma Verdade” (n. 616). Mas ele também escreve, nesse caso, o termo verdade entre aspas. Segundo a sua essência, essa “verdade” é uma “ilusão”. No entanto, como ilusão, ela é uma condição necessária da “vida”. Portanto, há de qualquer modo “verdade”? Com certeza! E Nietzsche seria o último a QUERER negar isso. Por conseguinte, a sua afirmação de que não há nenhuma “verdade” precisa significar algo mais essencial, a saber: a verdade não pode ser o elemento primeira e propriamente normativo. GA6MAC III

Perguntar o que é o conhecimento humano significa QUERER conhecer o próprio conhecimento. Com frequência, toma-se tal intuito por um contrassenso, por absurdo, paradoxal, comparável àquele intuito do barão de Munchhausen, ao QUERER se retirar de um pântano puxando a própria cabeça. Ao observar esse contrassenso, as pessoas se acham particularmente astutas e superiores. No entanto, elas se lembram tarde demais do caráter extremamente duvidoso de sua astúcia. Pois, para o homem, o conhecimento não é nada que ele possa conhecer e conheça de maneira apenas ocasional, somente depois de ter se empenhado na construção de uma teoria do conhecimento. Ao contrário, já reside no próprio conhecimento o fato de já ter se conhecido. GA6MAC III

A representação do ente como tal não é nenhum processo que apenas transcorre como que junto ao homem. Ao contrário, ela é, sim, um comportamento no qual o homem se encontra, e, em verdade, de tal modo que a inerência a tal [388] comportamento expõe o homem para o aberto dessa relação. Isso significa o seguinte: no comportamento representacional com o ente, o homem também já se relaciona – com ou sem uma “teoria” própria, com ou sem uma autoconsideração – incessantemente consigo mesmo. No entanto, isso também significa algo ainda mais essencial: o conhecimento já sempre se conheceu como tal; QUERER conhecer o conhecimento não é nenhum contrassenso, mas antes um intuito que possui um elevado caráter de decisão; pois tudo depende de que, junto à tentativa de um delineamento expresso do conhecimento, o conhecimento mesmo seja experimentado segundo o modo como ele já tinha sido conhecido antes de toda consideração ulterior sobre ele e tal como ele se acha aberto de acordo com a sua essência. Por isso, se se explicar de maneira puramente formal, ou seja, argumentando apenas com palavras e com sequências de palavras, que conhecer o conhecimento é um contrassenso e algo impossível, então isso já contém uma incompreensão essencial do conhecimento: uma incompreensão essencial do fato de que esse conhecimento é refletido em si mesmo e, por força dessa reflexão, já sempre se encontra na claridade de sua própria essência. GA6MAC III

“A compulsão subjetiva de não poder contradizer aqui é uma compulsão biológica: o instinto da utilidade de concluir assim como concluímos acha-se encravado em nosso corpo, quase somos esse instinto… Que ingenuidade, porém, QUERER retirar daí uma prova de que, com isso, possuímos uma ‘verdade em si’!… O não-poder-contradizer demonstra uma incapacidade, não uma ‘verdade?’ GA6MAC III

Como devemos compreender isso? Na melhor das hipóteses, o poder pode se mostrar como aquilo que a vontade de poder quer, ou seja, a finalidade diversa desse QUERER que é estabelecida antes dele. GA6MAC III

A consequência essencial dessa última palavra da metafísica, isto é, do projeto da entidade em vista da transformação do presentar-se em algo constante, torna-se manifesta na determinação correspondente da essência da “verdade”. Agora desaparece o último sopro de uma ressonância da aletheia. A verdade torna-se justiça no sentido do amalgamamento imperativo do comandar-se com o ímpeto de sua sobre-elevação. Toda correção é apenas um estágio prévio e uma ocasião para a sobre-elevação, toda fixação não passa de um ponto de apoio para a dissolução no devir, e, com isso, no QUERER da transformação do “caos” em algo constante. Agora só resta o apelo à vitalidade da vida. A essência inicial da verdade transformou-se de uma tal maneira que a sua metamorfose equivale ao afastamento da essência (não à aniquilação). O ser-verdadeiro dissolve-se na [473] presença de uma promoção do poder, uma presença concebida a cada vez no retorno. A verdade torna-se aqui uma vez mais o mesmo que o ser, só que este assumiu nesse ínterim o acabamento em sua inessência. Todavia, se a verdade como correção e como desvelamento é nivelada com a “conformidade à vida”, e se a verdade é assim afastada, então a essência da verdade perde todo o domínio. No âmbito do predomínio das “perspectivas” e dos horizontes que não levam a lugar algum, ou seja, que foram privados de toda clareira, ela não é mais digna de um questionamento. Mas o que é então? Nesse momento começa a dotação de sentido enquanto “transvaloração de todos os valores”. A “ausência de sentido” torna-se o único “sentido”. A verdade é “justiça”, isto é, a suprema vontade de poder. Somente faz jus a essa “justiça” o domínio incondicionado do homem sobre a Terra. No entanto, a instituição do elemento planetário já não é outra coisa senão a consequência da antropomorfia incondicionada. GA6MAC IV

Nietzsche compreende aqui por “sentido” (cf. §§ 1 e 4) o mesmo que “meta”. E por meta temos em vista o “para-quê” e a “causa pela qual” se dão todo agir, todo comportamento e todo acontecimento. Nietzsche enumera aquilo que o “sentido” buscado poderia ter sido, isto é, aquilo que, pensando historicamente, ele foi de maneira essencial, e, em modulações dignas de nota, ainda é: “a ordem ética do mundo”; “o acréscimo do amor e a harmonia no trânsito dos seres”, o pacifismo, a paz perpétua; “a aproximação de um estado de felicidade universal”, tal como a felicidade mais elevada possível do maior número possível; “ou mesmo a partida em direção a um estado de nada universal” – pois mesmo essa partida em direção a esse fito tem ainda um “sentido”: “um fito é sempre ainda um sentido”. Por quê? Porque ele possui uma meta, porque ele mesmo é a meta. O nada é um fito? Com certeza, pois QUERER o não QUERER ainda permite à vontade continuar querendo. A vontade de destruição é sempre ainda uma vontade. E na medida em que o QUERER é um querer-a-si-próprio, mesmo a vontade de nada permite ainda à vontade continuar sendo ela mesma – a vontade. GA6MAC V

A vontade humana “precisa de um fito – e ela ainda prefere QUERER o nada a não QUERER”. Pois, como vontade de poder, a “vontade” é poder para o poder ou, como também podemos dizer, vontade de vontade, vontade de permanecer em cima e de poder comandar. Não é diante do nada que a vontade se apavora, mas diante do não QUERER, da aniquilação de sua própria possibilidade essencial. O horror ante o vazio do não QUERER – esse “horror vacui” – é “o fato fundamental da vontade humana”. E é precisamente desse “fato fundamental” da vontade humana, do fato de que a vontade humana ainda prefere a vontade de nada ao não QUERER, que Nietzsche deduz o fundamento demonstrativo para a sua sentença de que a vontade é, em sua essência, vontade de poder (cf. Genealogia da moral, VII, p. 399; 1887). GA6MAC V

Se voltarmos a pensar a seção final do fragmento número 12 com vistas ao seu título “Declínio dos valores cosmológicos”, então se mostrará agora que esse título só cobre o todo desse fragmento se concebermos de antemão o niilismo no sentido de Nietzsche como história, isto é, ao mesmo tempo positivamente como o estágio prévio a uma “nova” instauração de valores; e isso de maneira tão decidida que experimentemos precisamente o niilismo mais extremo não como uma decadência completa, mas como a passagem para novas condições de existência. Por volta do tempo da escrita do número 12, Nietzsche fixou essa visão de conjunto da essência do niilismo na seguinte anotação: “Visão de conjunto. – De fato, todo grande crescimento também traz consigo uma descomunal desintegração e um descomunal perecimento: o sofrimento e os sintomas de declínio pertencem aos tempos de um avanço descomunal; todo movimento frutífero e poderoso da humanidade criou ao mesmo tempo um movimento niilista. Sob certas condições, o fato de a forma mais extrema do pessimismo, o niilismo propriamente dito, vir ao mundo seria o indício de um crescimento maximamente essencial, de uma passagem para novas condições de existência. Foi isso que compreendí (n. 112; início do ano – outono de 1887).” A seguinte anotação provém do mesmo período: “O homem é a besta ou o além-da-besta; o homem mais elevado é o não homem e o além-do-homem: os dois se compertencem. Com todo crescimento do homem em grandeza e elevação, este também cresce em seu caráter profundo e terrível: não se deve QUERER um sem QUERER o outro – ou muito mais: quanto mais fundamentalmente se quer um, tanto mais fundamentalmente se alcança precisamente o outro (n. 127).” GA6MAC V

Logo que tivermos elucidado para nós novamente o curso de nosso questionamento, mostrar-se-á o porquê de termos introduzido essa anotação justamente agora. Em contraposição àquilo que Nietzsche tornou visível como a história da metafísica, é preciso lançar um olhar mais originário na história da metafísica. Por conta de tal intuito, precisamos tornar mais claras a exposição e a concepção nietzschianas da metafísica. Ela é uma concepção “moral”. O termo “moral” significa aqui: um sistema de instaurações de valores. Toda interpretação do mundo, quer ela seja realizada de maneira ingênua ou calculada, é uma instauração de valores e, com isso, uma formação e uma configuração do mundo à imagem do homem. Sobretudo a instauração de valor que leva a sério a intelecção da origem humana dos valores e consuma o niilismo precisa QUERER e conceber expressamente o homem como legislador. Ela precisa procurar o verdadeiro e real na antropomorfização incondicionada de todo ente. GA6MAC V

Não obstante, ainda não medimos completamente o conteúdo e a amplitude da definiçãocogito é cogito me cogitare”. Todo QUERER e toda tomada de posição, todos os “afetos”, “sentimentos” e “sensações” estão ligados a algo querido, sentido e experimentado. Nesse caso, aquilo ao que eles estão ligados é representado e apresentado no sentido mais amplo possível do termo. Por isso, todos os modos de comportamento citados, não apenas o conhecimento e o pensamento, são determinados em sua essência pela re-presentação apresentadora. Todos os modos de comportamento possuem o seu ser em uma tal re-presentação, eles são um representar, representações – são cogitationes. Os modos de comportamento do homem são em sua realização e por meio dessa realização experimentados como os seus modos de comportamento enquanto tais, eles são experimentados como [568] aqueles, nos quais ele mesmo sempre se comporta a cada vez de tal ou tal maneira. Somente agora estamos em condições de compreender a breve resposta que Descartes (Principia philosophiae, I, 9) dá à pergunta: quid sid cogitatio? Ele diz: “Cogitationis nomine intelligo illa omnia, quae nobis consciis in nobis fiunt, quatenus eorum in nobis conscientia est. Atque ita non modo intelligere, velle, imaginari, sed etiam sentire, idem est sic quod cogitare”. “Pelo nome ‘cogitatio’ compreendo tudo aquilo que, para nós que também temos consciência de nós mesmos, ocorre em nós, na medida em que temos em nós um conhecimento concomitante dele. E não é apenas o conhecer, o QUERER e o imaginar que são assim, mas também o sentir é aqui o mesmo que denominamos o cogitare.” Se traduzirmos aqui irrefletidamente cogitatio por “pensamento”, então seremos tentados a achar que Descartes interpreta todos os modos de comportamento do homem como pensamento e como formas do pensamento. Essa opinião adapta-se bem à visão corrente sobre a filosofia de Descartes, segundo a qual ela seria justamente “racionalismo”. Como se aquilo que o racionalismo é não precisasse se determinar primeiramente a partir da delimitação da essência da ratio e do pensamento, como se a essência da ratio não precisasse se determinar de antemão a partir da essência a ser clarificada da cogitatio. Em relação a esse ponto, mostrou-se agora o seguinte: cogitare é re-presentar no sentido pleno de que a ligação com aquilo que é re-presentado, o a-presentar-se daquilo que é representado, a entrada em cena e o envolvimento daquele que representa ante aquilo que é representado, e, em verdade, no interior do re-presentar e por meio desse, são aí igualmente essenciais e precisam ser sobretudo copensados. GA6MAC V

O que está acontecendo aqui? Nietzsche faz o ego cogito remontar a um ego volo, e interpreta o velle como QUERER no sentido da vontade de poder, que ele pensa como o caráter fundamental do ente na totalidade. O que aconteceria, porém, se o posicionamento desse caráter fundamental só tivesse se tornado possível sobre o solo da posição metafísica fundamental de Descartes? Nesse caso, a crítica nietzschiana a Descartes seria um desconhecimento da essência da metafísica que não produzirá admiração senão naquele que ainda não percebeu que esse autodesconhecimento da metafísica se transformou em algo necessário no estágio de sua consumação. O quanto Nietzsche se encontra alijado das vias de uma meditação metafísica originária já é elucidado pela sentença seguinte: “O conceito de substância é uma consequência do conceito de sujeito: não o inverso! (A vontade de poder, n. 485, 1887)” Nietzsche compreende aqui “sujeito” no sentido moderno. Sujeito é o eu humano. O conceito de substância nunca é, como Nietzsche acredita, uma consequência do conceito de sujeito. O conceito de sujeito, porém, também não é a consequência do conceito de substância. O conceito de sujeito emerge da nova interpretação da verdade do ente que é pensado segundo a tradição como ousia, hypokeimenon e subtectum; e isso pelo fato de, em razão do cogito sum, o homem se tornar aquilo que se encontra propriamente na base, aquilo quod substat, substância. O conceito de sujeito não é outra coisa senão a limitação do conceito transformado de substância ao homem enquanto aquele que representa, aquele em cuja representação o representado e aquele que representa são estabelecidos firmemente em sua copertinência. Nietzsche desconhece a origem do “conceito de substância”, porque, apesar de toda crítica a Descartes e sem um conhecimento suficiente da essência de uma posição metafísica fundamental, ele considera a posição fundamental moderna da metafísica como incondicionadamente assegurada, colocando tudo no interior do primado do homem enquanto sujeito. Com certeza, o sujeito é agora concebido como vontade de poder. De acordo com isso, então, a cogitatio, o pensamento, também é interpretada de maneira diversa. GA6MAC V

Kant reconduz a metafísica enquanto uma “disposição natural” para a “natureza do homem”. Como se a “natureza do homem” estivesse inequivocamente [631] determinada! Como se a verdade dessa determinação e a fundamentação dessa verdade fossem assim tão absolutamente inquestionáveis! Agora, podemos apontar certamente para o fato de o próprio Kant (cf. Kant e o problema da metafísica, 1929, p. 197 e segs.; 2. ed., 1951, p. 185 e segs.), de qualquer forma, QUERER ver as questões fundamentais da metafísica reconduzidas à questão: “O que é o homem?” Por meio de uma interpretação corretamente conduzida da filosofia kantiana, podemos até mesmo mostrar o fato de Kant decompor a “natureza interna” do homem e fazer uso aí da distinção entre ser e ente, o fato de ele requisitar aquilo que aponta na direção dessa distinção como a essência da razão humana. Pois Kant prova que e como a razão humana pensa de antemão, a priori, a partir das categorias e que, por meio dessas categorias, é possibilitada uma objetividade dos objetos e um “conhecimento objetivo”. GA6MAC V

Qualquer um pode experimentar em si mesmo a qualquer momento o que significa “vontade”: QUERER é aspirar a algo. Todos sabem a partir de uma experiência cotidiana o que é o “poder”: o exercício da força. Dessa forma, aquilo que a “vontade de poder” significa é tão completamente claro que só a contragosto acrescentamos uma explicitação particular a essa construção vocabular. “Vontade de poder” é, inequivocamente, uma aspiração à possibilidade do exercício da força, uma aspiração à possessão de poder. A “vontade de poder” ainda expressa “um sentimento de falta”. A vontade “de” ainda não é o próprio poder porque ela ainda não é expressamente a detenção do poder. Consideramos a exigência daquilo que ainda não é um sinal do caráter romântico. Todavia, como um impulso para a tomada de poder, essa vontade de poder também é, ao mesmo tempo, a pura avidez por violência. Tais interpretações da vontade de poder, nas quais procuramos encontrar algo assim como um romantismo e uma perfídia, desfiguram o sentido da expressão fundamental da metafísica de Nietzsche; pois Nietzsche pensa de maneira diversa, quando fala sobre a “vontade de poder”. GA6MAC VI

Será que esse projeto só se encontra, então, sob o arbítrio desse pensador? Assim o parece. Essa aparência de arbitrariedade também pesa, inicialmente, sobre a apresentação daquilo que Nietzsche pensa ao proferir a expressão “vontade de poder”. Mas Nietzsche quase não falou sobre a vontade de poder nos escritos publicados por ele mesmo. Isso pode ser considerado como um sinal de que ele queria salvaguardar pelo maior tempo possível esse elemento maximamente interno da verdade por ele reconhecida do ente enquanto tal e colocá-lo sob a proteção de um dizer unicamente simples. Na segunda parte de Assim falou Zaratustra (1883), o que é dito é a vontade de poder, mas ainda sem a distinção de uma noção fundamental. O título do capítulo em que se realiza a primeira visualização plena da essência daquilo que é dito desse modo fornece um aceno para a compreensão correta. No capítulo “Do superar a si mesmo”, Nietzsche diz: Onde encontrei o vivente, aí encontrei vontade de poder; e mesmo na vontade do servo encontrei a vontade de ser senhor.” Em seguida, a vontade de poder mostra-se como o caráter fundamental da vida. A “vida” é considerada por Nietzsche como uma outra palavra para dizer “ser”. “O ‘ser – nós não temos nenhuma outra representação disto senão ‘viver. – Ora, como é que algo morto poderia ‘ser’?” (A vontade de poder, n. 582). QUERER, porém, é QUERER ser senhor. Essa vontade ainda está no QUERER do servo; e isso não na medida, por exemplo, em que ele aspira a se libertar do papel do escravo, mas na medida em que ele é escravo e servo e, enquanto [647] tal, sempre tem sob si o objeto de seu trabalho, o qual ele “comanda”. E na medida em que o servo enquanto tal se torna imprescindível para o senhor, coagindo, assim, o senhor a ser junto a ele e a remeter-se a ele (ao escravo), o escravo domina o senhor. O ser servo ainda é um tipo de vontade de poder. QUERER nunca seria QUERER ser senhor se a vontade só permanecesse um QUERER e uma aspiração, ao invés de ser desde o seu fundamento tão somente: comando. GA6MAC VI

Todo vivente é vontade de poder. “Ter e QUERER ter mais, dito em uma palavra crescimento – é isto que é a própria vida” (A vontade de poder, n. 125). Toda mera conservação de poder já é decadência da vida. Poder é o comando para o mais-poder. Contudo, para que a vontade de poder enquanto superpotencialização possa ultrapassar um estágio, esse estágio não precisa ter sido apenas alcançado, mas também fixado e assegurado. É somente a partir de um tal asseguramento do poder que o poder alcançado pode ser elevado. Por isso, a elevação do poder é ao mesmo tempo em si novamente conservação do poder. O poder só pode apoderar-se de si mesmo para uma superpotencialização na medida em que comanda antes de tudo a elevação e a conservação. É constitutivo daí o fato de o próprio poder e apenas ele estabelecer as condições da elevação e da conservação. GA6MAC VI

Segundo a sua essência mais íntima, a vontade de poder é um contar pers-pectivístico com as condições de sua possibilidade, condições que ela mesma estabele enquanto tais. A vontade de poder é, em si, instauradora de valores. “A pergunta acerca dos valores é mais fundamental do que a pergunta acerca da certeza: essa última questão só conquista a sua seriedade sob a pressuposição de que a questão do valor foi respondida” (A vontade de poder, n. 588). “QUERER em geral é o mesmo que querer-ser-mais-forte, querer-crescer – e QUERER também os meios para tanto” (A vontade de poder, n. 675). Os meios essenciais, porém, são aquelas “condições” sob as quais a vontade de poder se encontra segundo a sua essência: os “valores”. “Em toda vontade há um avaliar (XIII, 172). A vontade de poder – e apenas ela – é a vontade que quer valores. Por isso, ela precisa se tornar por último expressamente aquilo de que toda instauração de valores parte e que domina toda apreciação de valores: ela precisa se tornar o “princípio da instauração de valores”. Desse modo, logo que é expressamente reconhecido na vontade de poder o caráter fundamental do ente enquanto tal e que a vontade de poder ousa declarar a si mesma, torna-se incontornável para um pensamento segundo valores pensar transversalmente o ente enquanto tal em sua verdade, isto é, a verdade enquanto pensamento da vontade de poder. GA6MAC VI

O pessimismo nega o mundo subsistente. Sua negação, contudo, é ambígua. Ela pode QUERER simplesmente o declínio e o nada. Todavia, também pode recusar o subsistente e, assim, abrir um caminho para a nova configuração do mundo. Por meio daí desdobra-se o pessimismo “como força”. Esse pessimismo possui um olhar para aquilo que é. Ele vê aquilo que é perigoso e inseguro e procura pelas condições que prometem um assenhoreamento da situação histórica. O que caracteriza o pessimismo da força é a sua capacidade “analítica”, um termo pelo qual Nietzsche não compreende a decomposição e a dissolução excitadas da “situação histórica”, mas a explicitação fria, uma vez que já empreendida com lucidez, e a apresentação das razões pelas quais o ente é tal como ele é. Em contrapartida, o pessimismo que só vê declínio provém da “fraqueza”: ele busca por toda parte o elemento sombrio, fica à espreita das ocasiões em que o fracasso se dá e acredita ver assim como tudo virá. Ele compreende tudo e consegue aduzir para cada evento que se dá uma correspondência a partir do [657] passado. Diferentemente da “analítica”, a sua característica é o “historicismo” (A vontade de poder, n. 10). GA6MAC VI

Por meio da inversão niilista, a subjetividade invertida do representar não é apenas virada para a subjetividade do QUERER, mas a essência da incondicionalidade até aqui ainda é até mesmo atacada e transformada por meio do primado essencial da vontade. A incondicionalidade do representar continua sendo condicionada por meio daquilo que se lhe apresenta. É apenas a incondicionalidade da vontade, porém, que se apodera até mesmo daquilo que é passível de ser apresentado e que o transforma em algo assim. A essência da subjetividade incondicionada só alcança a sua consumação em um tal apoderamento invertido da vontade. Essa consumação não significa uma perfeição, que ainda precisaria ser medida a partir de um critério subsistente em si. Consumação significa, aqui, que a possibilidade extrema e até aqui retida da essência da subjetividade se torna o centro essencial. Por isso, a vontade de poder é a subjetividade incondicionada, e, porque ela é a subjetividade invertida, ela também é pela primeira vez a subjetividade consumada – uma subjetividade que esgota ao mesmo tempo a essência da incondicionalidade por força de uma tal consumação. GA6MAC VI

A mesma inversão da subjetividade da razão incondicionada na subjetividade incondicionada da vontade de poder transpõe, então, ao mesmo tempo, a subjetividade para o interior do pleno poder irrestrito inerente ao desdobramento exclusivo de sua própria essência. Agora, a subjetividade enquanto a vontade de poder própria à dotação de poder para a superpotencialização não quer senão a si mesma como poder. QUERER a si mesmo quer dizer aqui: colocar-se diante de si na consumação mais elevada da própria essência e ser, dessa forma, essa essência mesma. Portanto, a subjetividade consumada precisa estabelecer a sua própria essência para além de si mesma a partir de seu ponto mais íntimo. GA6MAC VI

A única questão é que a subjetividade consumada impede a existência de um fora dela mesma. Nada que não se encontre no campo de poder da subjetividade consumada pode erguer uma petição de ser. Até mesmo o suprassensível e o âmbito de um Deus suprassensível são derrubados. Como só o homem se acha agora enquanto vontade representadora e instauradora de valores em meio ao ente enquanto tal na totalidade, ele precisa oferecer à subjetividade consumada os sítios de sua essência pura. Por isso, a vontade de poder como a subjetividade consumada pode colocar a sua essência no sujeito, de acordo com o qual o homem é, e, em verdade, aquele homem que foi além do homem até aqui. Posta em seu ápice, portanto, a vontade de poder enquanto a subjetividade consumada é o sujeito supremo e único, ou seja, o além-do-homem. Esse além-do-homem não vai além apenas niilisticamente da essência humana até aqui, mas, enquanto a inversão dessa essência, também vai ao mesmo tempo além de si mesmo em direção ao seu incondicionado; e isso significa, sobretudo, o seguinte: em direção ao cerne da integralidade do ente, em direção ao eterno retorno do mesmo. Caso [674] queira a si mesma e caso queira uma meta em sintonia com o seu modo de ser, a nova humanidade em meio ao ente, que é na totalidade desprovido de metas e, enquanto tal, vontade de poder, precisa QUERER necessariamente o além-do-homem: “Não a ‘humanidade’, mas o além-do-homem é a meta!” (A vontade de poder, n. 1.001). O “além-do-homem” não é nenhum ideal suprassensível; ele também não é nenhuma pessoa que se anuncia em um momento qualquer e que entra em cena em um lugar qualquer. Enquanto o sujeito supremo da subjetividade consumada, ele é a pura dinâmica de poder intrínseca à vontade de poder. Por isso, a ideia do “além-do-homem” também não emerge de uma “presunção” do “senhor Nietzsche”. Se quisermos levar em conta a origem dessa ideia a partir do pensador, então ela reside na decisão mais íntima, a partir da qual Nietzsche se submete à necessidade essencial da subjetividade consumada, isto é, à última verdade metafísica sobre o ente enquanto tal. O além-do-homem vive, na medida em que a nova humanidade quer o ser do ente como a vontade de poder. Ela quer esse ser porque ela mesma é querida por ele, isto é, entregue incondicionadamente a si mesma enquanto humanidade. GA6MAC VI

Desse modo, Zaratustra, que ensina o além-do-homem, conclui a primeira parte de sua doutrina com a sentença: “‘Mortos estão todos os deuses: agora queremos que o além-do-homem viva’ – Que isto se mostre, em algum momento, no grande meio-dia de nossa derradeira vontade! – ” (Assim falou Zaratustra, Parte I, Conclusão). No tempo da mais luminosa claridade, uma vez que o ente na totalidade se mostra como eterno retorno do mesmo, a vontade precisa QUERER o além-do-homem; pois só sob a perspectiva do além-do-homem é possível suportar o pensamento do eterno retorno do mesmo. A vontade, que quer aqui, não é um desejo e uma aspiração, mas a vontade de poder. O “nós”, que queremos aí, aponta para aqueles que experimentaram o caráter fundamental do ente como vontade de poder e sabem que essa vontade, no seu ponto mais elevado, quer a sua própria essência e, assim, há a ressonância com o ente na totalidade. GA6MAC VI

O além-do-homem não significa a grosseira ampliação do arbítrio de feitos violentos usuais segundo o modo de ser do homem até aqui. Diferentemente de todo exagero do homem até aqui em direção ao desmedido, o passo rumo ao além-do-homem transforma essencialmente o homem até aqui no seu “inverso”. Esse inverso também não apresenta simplesmente um “novo tipo” de homem. Ao contrário, o homem niilisticamente invertido é, pela primeira vez, o homem enquanto tipo. “Trata-se do tipo: a humanidade é meramente o material experimental, o excesso descomunal do malfadado: um campo de ruínas” (A vontade de poder, n. 713). Para a sua própria essência, a própria incondicionalidade consumada da vontade de poder exige como condição que a humanidade consonante [677] com essa subjetividade queira a si mesma e possa apenas QUERER a si mesma, na medida em que se determina lúcida e voluntariamente para a cunhagem do homem niilisticamente invertido. GA6MAC VI

Se o ente na totalidade é eterno retorno do mesmo, então só resta à humanidade que precisa conceber a si mesma em meio a essa totalidade como vontade de poder a decisão sobre se ela não quer antes o nada experimentado niilisticamente do que o não QUERER em geral, e, com isso, do que o abandono de sua possibilidade essencial. Se a humanidade quer o nada compreendido clássico-niilisticamente, ela cria para si sob o martelo do eterno retorno do mesmo um estado que torna necessário o tipo invertido de homem. No interior da totalidade desprovida de sentido, essa cunhagem humana estabelece a vontade de poder como o “sentido da Terra”. O último período do niilismo europeu é a “catástrofe” no sentido afirmativo da viragem radical: “o despontar de uma doutrina, que seleciona os homens… que impele os fracos, assim como os fortes, a se decidirem (A vontade de poder, n. 56). Se o ente enquanto tal é vontade de poder, o ente na totalidade enquanto eterno retorno do mesmo precisa se abater sobre e se apoderar de cada ligação com o ente. Se o ente na totalidade é eterno retorno do mesmo, então o caráter fundamental do ente se torna manifesto como vontade de poder. Se o ente vigora enquanto vontade de poder na totalidade do eterno retorno do mesmo, a subjetividade incondicionada e consumada da vontade de poder precisa se colocar humanamente no sujeito do além-do-homem. A verdade do ente enquanto tal na totalidade é determinada pela vontade de poder e pelo eterno retorno do mesmo. Essa verdade é preservada por meio do além-do-homem. A história da verdade do ente enquanto tal na totalidade e, de acordo com ela, a história da humanidade envolvida por ela em sua região possui o caráter fundamental do niilismo. De onde é, porém, que a verdade assim preenchida e assim preservada do ente enquanto tal na totalidade retira a sua essência mais própria? GA6MAC VI

A verdade como asseguramento da consistência do poder está essencialmente ligada à arte enquanto elevação do poder. Verdade e arte possuem uma única essência oriunda da simplicidade monofacetada da vontade de poder. É aqui que a essência plena da verdade possui o fundamento de sua determinação. O elemento mais íntimo que impele a vontade de poder ao seu extremo é o fato de ela QUERER a si mesma em sua superpotencialização: de ela QUERER a subjetividade incondicionada, mas invertida. Desde o momento em que o ente enquanto tal na totalidade começa a se desdobrar sob o modo de ser da subjetividade, o homem também se torna sujeito. Como ele assume um comportamento em [685] relação ao ente por força de sua razão, o homem é em meio ao ente na totalidade, na medida em que se apresenta e, com isso, coloca a si mesmo necessariamente em toda re-presentação. GA6MAC VI

O modo de pensar é “construtivo”. Ele edifica algo que ainda não se encontra e que talvez nunca venha a se encontrar como um ente presente à vista. A edificação é um erigir. Ela se lança em direção à altura, de tal maneira, em verdade, que a altura é aí conquistada e aberta pela primeira vez enquanto tal. A altura edificada na construção assegura a claridade das condições, sob as quais se acha a possibilidade do comando. A partir da claridade dessa altura, o comando não pode se dar senão de uma tal forma que, no comando, toda obediência se transfigura em QUERER. Essa altura indica a direção para o que é correto. GA6MAC VI

Com certeza, para pensarmos adequadamente a essência da justiça que é própria a essa metafísica, precisamos colocar de lado todas as representações sobre a justiça que provêm da moral cristã, humanista, iluminista, civil e social. Com efeito, o justo continua sendo aquilo que é consonante com o “correto”. Mas o correto, que indica a direção e dá a medida, não subsiste em si. O correto fornece, em verdade, o direito para algo. A questão é que o correto se determina, por sua vez, a partir daquilo que é “direito”. A essência do direito, contudo, é demarcada por Nietzsche da seguinte forma: “Direito = vontade de eternizar uma relação de poder respectiva” (XIII, 205). Justiça é, então, a capacidade de estabelecer o direito assim compreendido, isto é, de QUERER uma tal vontade. Esse QUERER só pode ser como a vontade de poder. GA6MAC VI

Enquanto a relação com o ser, seja essa relação entendida como a relação com o ente enquanto tal, seja ela compreendida como a relação com o ser mesmo, a in-sistência ek-stática no aberto da localidade do ser é a essência do pensamento. A essência do pensamento assim experimentada, a saber, a partir do ser, não se determina a partir de uma delimitação em relação ao QUERER e ao sentir. Por isso, também não podemos demarcá-la como o comportamento meramente teórico em contraposição ao comportamento prático, restringindo-a em sua amplitude essencial para a essência do homem. GA6MAC VIII

Superar e QUERER superar o niilismo agora pensado em sua essência significa dizer que o homem se lança por si contra o ser mesmo em sua permanência de fora. Ora, mas quem ou o que seria algum dia suficientemente potente para se lançar contra o próprio ser, qualquer que seja o aspecto e a intenção em que isso aconteça, e colocá-lo sob o império do homem? Uma superação do próprio ser não apenas nunca pode ser levada a termo, como já a tentativa para tanto recairia no propósito de modificar fundamentalmente a essência do homem. Pois os gon-zos dessa essência consistem no fato de o próprio ser, como quer que isso venha a [720] ser, mesmo sob o modo da permanência de fora, requisitar a essência do homem; uma essência que se mostra como o abrigo, com o qual o ser mesmo se dá, a fim de se entregar como a chegada do desvelamento ao cerne de um tal abrigo. GA6MAC VIII

QUERER superar o ser significaria modificar fundamentalmente a essência do homem. Nós poderiamos compreender de tal modo o caráter impossível desse propósito, como se se tratasse de um procedimento absurdo do pensamento, que pensa enquanto tal a partir do ser, QUERER se arremeter contra o ser; como se esse propósito ainda fosse mais absurdo – caso pudéssemos falar aqui de níveis – do que aquela tentativa do pensamento de negar no pensamento, que é de qualquer modo algo essente, o ente enquanto tal. Entretanto, o que se encontra em jogo aqui não é apenas saber se o pensamento tomado por si em sua própria atividade se contradiz e deixa de respeitar, assim, uma de suas regras fundamentais, recaindo, portanto, no absurdo. O quão frequentemente o pensamento humano não se enreda em contradições, e, contudo, permanece na via, por meio da qual ele conta consigo. GA6MAC VIII

O que está em questão não é o fato de, na tentativa de se arremeter contra a permanência de fora do ser enquanto tal, e, com isso, contra o ser mesmo, não se seguir uma regra do pensamento, mas o fato de o ser mesmo não ser admitido como o ser, de ele ser muito mais deixado de fora. Em uma tal omissão, porém, reconhecemos um traço essencial do niilismo. QUERER se arremeter imediatamente contra a permanência de fora do ser mesmo significaria não atentar para o ser mesmo enquanto ser. A superação assim almejada do niilismo não seria senão uma recaída ainda mais terrível no impróprio de sua essência, no impróprio que encobre o seu próprio. O que aconteceria, contudo, se a superação não se arremetesse de maneira alguma imediatamente contra a permanência de fora do ser mesmo e deixasse de meramente se medir pelo ser mesmo, arremetendo-se, entretanto, contra a omissão da permanência de fora? Essa omissão sob a forma da metafísica é a obra do pensamento humano. Como é que esse pensamento não deveria se arremeter contra o seu deixar de pensar justamente o ser mesmo em seu desvelamento? GA6MAC VIII

Se atentarmos para a essência do niilismo como uma história do próprio ser, então o propósito de uma superação do niilismo se torna caduco, se com isso tivermos em vista o fato de o homem sempre controlar por si essa história e obrigá-la a se submeter ao seu mero QUERER. Uma superação do niilismo também é equivocada no sentido de que um pensamento humano se arremeteria contra a permanência de fora do ser. GA6MAC VIII

Pensando a partir de um tal ponto de vista, será que a essência do niilismo é algo abstrato? Ou será que esse elemento essencializante da própria história do ser é o acontecimento, a partir do qual toda história agora acontece? Será que o fato de a historiologia, até mesmo aquela historiologia do nível e da amplitude da historiologia de Jacob Burckhardt, não saber e não QUERER saber nada sobre tudo isso é uma prova suficiente de que não “há” essa essência do niilismo? GA6MAC VIII

A ausência de penúria enquanto a mais extrema penúria velada do ser é, contudo, dominante precisamente na era da desertificação do ente e da confusão, da violência do humanismo e de seu desespero, do arruinamento do QUERER e de sua impotência. Um sofrimento ilimitado e uma pena desmedida evidenciam o estado do mundo e o silenciam por toda parte como o estado pleno de penúrias. Não obstante, ele é no fundo de sua história desprovido de penúria. Em termos da história do ser, porém, essa é a sua penúria extrema e, ao mesmo tempo, a mais velada. Pois ela é a penúria do próprio ser. GA6MAC VIII

O nome “subiectidade” denomina a história una do ser desde a cunhagem essencial do ser como idea até a consumação da essência moderna do ser como vontade de poder. A pluralidade de facetas da essência moderna já se sobressai no começo pleno da metafísica moderna: Ser é a realidade efetiva no sentido da representidade indubitável. Ser é realidade efetiva no sentido da aspiração representadora, que sempre se apropria de um ente que é um mundo a partir de uma unidade simples. Enquanto uma tal apropriação, o ser é actualitas. O ser, contudo, enquanto a realidade efetiva assim atuante (afeiçoante), possui o traço fundamental da vontade. Enquanto esse QUERER, o ser é a dotação de consistência própria à constância, que, no entanto, permanece um devir. O ser é, na medida em que todo QUERER é um querer-se, distinto pelo “com-vistas-a-si”, cuja essência propriamente dita é alcançada na razão como mesmidade. Ser é vontade de vontade. Todos esses traços do ser que pertencem à subiectidade enquanto subjetividade desdobram uma essência una que, de acordo com o seu caráter existenciário, desenvolve a si mesma e, com isso, a totalidade do ente em direção à sua unidade própria, isto é, em direção ao concerto de sua conjunção essencial. Logo que o ser alcança a essência da vontade, ele passa a ser em si mesmo sistemático e a se mostrar como um sistema. GA6MAC VIII

Tudo aquilo que em geral se chama existentia, existência, realidade efetiva, ser-aí na metafísica é: 1. ousia do hypokeimenon kathauto, isto é, do ekaston; a prote ousia; o presentar como a demora do ente respectivo (Aristóteles). [801] 2. Essa prote ousia é concebida como energeia do ón, como tode tí ón, como o presentar daquilo que é produzido e instituído, como o caráter de obra. O nome mais abrangente para einai como presentar, um nome que explicita ao mesmo tempo a sua interpretação grega é: hyparchein. Nesse nome está dito o hypo-keisthai, o já-encontrar-se-perante pensado juntamente com a arche, o início dominante; hyparchein significa: já dominar enquanto algo que se encontra perante, o “pre-domínio” pensado em termos gregos como: presentar-se por si. 3. A energeia é reinterpretada como a actualitas do actus. O agere como facere, creare. A pura essência da actualitas é o actus purus como a existentia do ens, a cuja essentia pertence a existentia. (Teologia medieval) É o desempenho como obtenção do efetuado, e não o deixar presentar-se no desvelamento que caracteriza o actus. 4. De acordo com a mudança da veritas para certitudo, a actualitas é concebida como actus do ego cogito, como percipere, repraesentare. O primado do subiectum no sentido do ego (Descartes); o existere como o esse do ego sum; o repraesentare (percipere) contra o noein enquanto idein, e este contra o noein de Parmênides. A partir do ser enquanto presença surge o ser como representidade no sujeito. 5. O repraesentare como perceptio-appetitus no sentido da vis primitiva activa é a actualitas de cada subiectum no antigo sentido, e determina a essência da substância como a mônada. A diferença correspondente entre fenômeno e phainesthai. Existentia é agora exigentia essentiae; seu principium é a perfectio; perfectio é gradus essentiae; essentia, porém, é nisus ad existendum. A distinção escolástica entre potentia e actus, que representa ela mesma uma reinterpretação da distinção aristotélica entre dynamis-energeia, é superada (Leibniz). 6. A existência como actualitas, como realidade efetiva, como ter sido efetuado e ser atuante transforma-se na objetividade da experiência e é, assim, uma modalidade ao lado de possibilidade e necessidade. 7. A certeza incondicionada da vontade que sabe a si mesma como a realidade efetiva absoluta (espírito, amor). A existência como ser é determinada a partir da distinção “real” do ser do ente segundo: fundamento de existência e existência do fundamento. Como a vontade constitui a essência do ser, a distinção é a distinção que pertence ao próprio QUERER: à vontade do fundamento e à vontade do entendimento. [802] Existência: o tornar-se manifesto, trazer-se-a-si-mesmo, o ser si mesmo no tornar-se si mesmo de encontro a e contra o fundamento. Devir em si “contraditório” (Schelling). 8. A existência no sentido de Schelling é restrita por Kierkegaard ao ente, que “é” na contradição entre temporalidade e eternidade: ao homem que quer ser ele mesmo. Existir como crer, isto é, manter-se na realidade efetiva do ente efetivamente real que o homem mesmo a cada vez é. Crer como o tornar-se manifesto diante de Deus. Manter-se junto ao ente efetivamente real que é próprio ao fato de Deus ter se tornado homem. Crer como ser Cristo no sentido do tornar-se Cristo. 9. Existência no sentido de Kierkegaard, apenas sem a ligação à crença cristã, ao ser Cristo. Ser si mesmo como personalidade a partir da comunicação com outros. Existência na ligação à “transcendência” (K. Jaspers). 10. Existência – temporariamente usada em Ser e tempo como a insistência ekstática na clareira do aí do ser-aí. Insistência na verdade do ser, fundada sobre a fundação expressa da diferença ontológica, isto é, da distinção entre ente e ser (para além de toda metafísica e de toda filosofia da existência). 11. Como desaparece na metafísica de Nietzsche a distinção entre essentia e existentia, por que essa distinção precisa desaparecer no fim da metafísica e como, contudo, justamente com isso é alcançado o afastamento mais amplo em relação ao início? O desaparecimento, porém, só pode ser mostrado na medida em que tentamos tornar visível a distinção: vontade de poder como essentia; eterno retorno do mesmo como existentia (cf. “A metafísica de Nietzsche”). GA6MAC IX

O ser e o encurtamento do conceito de existência 1. A utilização acentuada do conceito de existência na distinção schellingiana entre a existência do fundamento e o fundamento da existência (ser como QUERER). 2. O encurtamento desse conceito de existência à crença dos cristãos por meio de Kierkegaard (existência – cristandade) (crença – teologia). 3. A assunção do conceito kierkegaardiano de existência na “filosofia da existência” (K. Jaspers). Existência: ser si mesmo – comunicação – metafísica. [803] 4. Existência como o caráter do ser-aí em Ser e tempo (história do ser). Aqui não está nem em jogo o conceito kierkegaardiano, nem o conceito da filosofia da existência. Ao contrário, a existência é pensada com vistas ao caráter ekstático do ser-aí com o intuito de uma interpretação do ser-aí em sua ligação insigne com a verdade do ser. O emprego temporário do conceito de existência só é condicionado por essa questão. A questão não serve senão à preparação de uma superação da metafísica. Tudo isso se encontra fora da filosofia da existência e do existencialismo, permanece abissalmente diverso da paixão no fundo teológica de Kierkegaard, mas mantém-se, em contrapartida, em uma confrontação essencial com a metafísica. GA6MAC IX

[804] Schelling: “QUERER é o ser originário”. Todo ser é existir: existência. Mas existência é existência do fundamento. Ao ser pertence existência e fundamento de existência. Ao ser pertence essa subdivisão enquanto “real”. O ser mesmo é de tal modo que o ente enquanto tal se distingue. Essa distinção reside na essência do QUERER. A distinção: vontade do fundamento e vontade do entendimento. Em que medida? A vontade na vontade é entendimento. A “distinção” schellingiana visa a uma contraposição (luta) que atravessa, articula e vige em todos os seres (entes em suas entidades); e isso tudo sempre sobre a base da subjetividade. Ser originário – é vontade. O ser (ainda não um-ser-ente) é fechamento. O ente (substantivamente, verbal-transitivamente): o mesmo. Ser-em-si. GA6MAC IX

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